domingo, 6 de fevereiro de 2011
Mais uma vez, outra vez....
Há muitos prazerem em contar uma história para uma criança. Um deles, com certeza, é acompanhar o pequeno leitor/ouvinte no desvendar da narrativa. Este desvendar, vejo com meus filhos, é muitas vezes lento e cumprido em várias etapas. A criança pede a mesma história várias vezes, ouve a mesma coisa à exaustão de quem lê, mas em cada uma dessas vezes descobre um novo significado naquela narrativa. Só isso explica como pode uma criança, como, por exemplo, meus filhos, cada um a sua época, aguentar ouvir todos os dias Os três porquinhos sem se cansar. O Pedro cresceu, fez nove anos, já é capaz de perceber com clareza os desafios que uma narrativa lhe propõe, mas ainda ouve histórias contadas pela mãe. Assim foi com Perde quem fica zangado primeiro, um reconto de Italo Calvino para a história do embate de um camponês com um ganancioso padre, colhida na tradição popular italiana. Eu conheci o livro, editado pela Companhia das Letrinhas, nas mãos da Sônia Monnerat, minha professora na UFF, e vi logo que ele tinha tudo para encantar o Pedro. A narrativa de Calvino tem tudo que uma história precisa para cativar uma criança: uma boa dose de fantasia e de humor. Estes atrativos, no entanto, não tornam a história fácil. A narrativa de Calvino não tem nada de simplória, como a origem popular do conto poderia supor, e o enredo propõe tramas engenhosas para os duelos do camponês com o padre. Para acompanhá-la é preciso prestar uma bruta atenção para, ao fim, perceber que Perde quem fica zangado primeiro é, na verdade, ganha quem for mais paciente e inteligente. Foi isso que encantou o Pedro. Mas esta percepção, a princípio, foi apenas uma intuição. Ele recorreu a mim e às ilustrações de Susanne Janssen, reproduzidas da edição alemã, para entender as sutilezas da narrativa e traduzir os regionalismos de uma Itália agrária. Estas descobertas, no entanto, foram um prazer enorme para ele. Há muito não o via vibrar tanto com uma leitura, como com este livro que ele me fez ler três noites seguidas. Que Calvino nos conte outra!
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