As perguntas do menino se sucedem às explicações do homem, que aos poucos revela os mistérios do tempo em uma linguagem que expressa a generosidade do velho diante do novo. “O que é tolerância?”, pergunta o menino, que ouve do homem que é “gostar das coisas mesmo sabendo que elas não são como eu quero”. E conclui, paciente: “Aprendi com o tempo”.
A delicadeza do diálogo do homem com o menino traz em si uma preciosidade. A serenidade do homem diante da consciência de que o tempo não pára e que está caminhando para seu fim. “Hoje, ele é curto e demanda cuidados”, diz o narrador, diante da infância de seu interlocutor. Esta serenidade empresta uma grandeza ao personagem, que, desta forma, se aproxima dos anciões das sociedades tradicionais em que valores eram transmitidos no diálogo entre jovens e velhos.
A história do diálogo do homem com o menino ainda tem como mérito o fato de trazer em sua narativa as marcas do tempo na prosa de Bartolomeu. Marcas que se equivalem aos risquinhos no rosto do narrador e dão legitimidade a um discurso quase que filosófico sobre o tempo. A riqueza desta prosa valeu dois importantes prêmios para Tempo de voo: o Glória Pondé, concedido pela Biblioteca Nacional a obras infantis e juvenis, e Jovem Hors-Concours da Fundação Nacional do Livro Infanto-Juvenil.
Toda esta riqueza se potencializa no encontro com as ilustrações do espanhol Alfonso Ruano. O ilustrador busca inspiração em seus compatriotas surrealistas, da vanguarda do início do século XX, para compor as ilustrações que, prenhes de significados, traduzem com inspiração as inquietações do homem de Bartolomeu diante do tempo. Belas ilustrações para valorizar uma leitura que vale a pena ser feita por jovens ou não tão jovens que queiram abrir um diálogo interior com suas memórias ou com as possibilidades de seu porvir.
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