sábado, 9 de junho de 2012
Irmãos de verdade, no amor e no ódio
Livros para crianças são como livros para adultos. A cada dia que os abrimos, nos surpreendemos com uma nova leitura. É esse o grande barato de quem gosta de guardar seus livros. Poder revisitá-los e ter uma nova emoção, revivendo o que para muitos é um amontoado de papel velho. Assim, tem sido na minha vida e na dos meus meninos. A gente implica com um livro e depois faz as pazes com ele. A gente gosta de algum e um tempo depois, vê que gosta ainda mais. Não foi diferente com Por favor, Eleonor!, de Frieda Wishinsky, editado pela Brique-Book. Eu o comprei para o Pedro, logo depois que o Antônio nasceu, animada com as delicadas ilustrações da canadense Marie-Louise Gay - sou fã dela - e li algumas vezes para ele, que, como eu e o irmão, ama as histórias de Estela e Marcos. O livro foi mais um para o Pedro. Não causou nenhuma emoção maior e acabou rapidamente esquecido na estante. Até que há poucos dias o resgatei das prateleiras para lê-lo para o Antônio. Apresentei João e Eleonor como primos da Estela e do Marcos, parentesco garantido no traço de Marie-Louise Gay e na verdade da relação dos dois irmãos. Esses dados garantiram empatia imediata entre Antônio-leitor-ouvinte e os personagens. O resto ficou por conta da identificação com a história de João e Eleonor. O irmão mais velho passa grande parte da história desejando que a menina, sua imã, caia fora. Como a menina não cai fora, ele passa a desejar que ela seja um cachorro. É quando um estranho cão aparece na história e deixa João desesperado, com medo de seu desejo ter se transformado em realidade. Tenho certeza de que o Antônio sabe bem o que é isso. Sabe também o que é desejar estar perto do irmão mais velho e não ser desejado. Sabe também o que fazer para levar o outro à loucura. Sabe ainda o que é esquecer-se desse desejo quando um amigo aparece. Essa verdade, contida no livro, vale mais do que mil histórias de irmãos fraternos e amorosos para apaziguar os ódios passageiros que só acometem irmãos que se amam. O Pedro, no seu tempo de curtir o livro, ainda não tinha esta experiência com o Antônio, que não passava de um bebê. Agora, com os dois grandes, brigando como João e Eleonor, a história ganhou novo sentido, antes oculto no texto e nas ilustrações. Ganhou o Antônio, que pode ver que ele e o Pedro não são os únicos irmãos a amarem-se no amor e no ódio.
Muito bacana.
ResponderExcluirGosto muito do seu blog, estou começando a montar a biblioteca do Enzo e sempre venho aqui ler suas resenhas.
É incrível -e delicioso- como as artes nos explicam muito sobre nós mesmos, são nossos espelhos. E, como você disse, cada vez que entramos em contato com arte, nos vemos de uma forma diferente. Cada vez que lemos o mesmo livro, na verdade, estamos lendo um livro novo. Talvez não exista releitura propriamente.
Abraços