segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A porta aberta pela literatura

A Ana, do blog Abrindo Clareiras, me provocou a tomar partido sobre um debate, que travava com uma amiga, sobre o incentivo, dado por alguns  pais a seus filhos, de ler mediante recompensa em dinheiro. Fui lá responder e me posicionar contra esta estratégia de garantir a leitura com estímulo financeiro e decidi falar um pouco disso também aqui no blog, por saber que o desafio de formar leitores inquieta muitos pais e professores, como inquieta a mim. Discordo dessa estratégia, como discordo de qualquer método coercitivo. Quantos brasileiros não se desgostaram da leitura, em suas aulas de português em que eram obrigados a ler clássicos e a responder a questões de maçantes provas? Nem sei quantos. Não tenho dúvidas de que a leitura deve ser, antes de tudo, um prazer, uma porta aberta para novas sensações e experiências. Mostrar a nossos filhos esta porta, é nosso grande desafio. Mas temos que reconhecer ainda, sem ares de derrota, que muitas pessoas passam a vida sem achar este caminho e, mesmo assim, vivem felizes. Não podemos ser arrogantes ao ponto de pensar que só seremos homens e  mulheres plenos se lermos. A diferença é que, quem encontra esta porta, ganha novos horizontes em um universo onde tudo é possível, um universo de liberdade e possibilidades. O caminho para esta porta, no entanto, não é fácil. Acredito que ela não esteja sempre e, em cada um de nós, no mesmo lugar. Em cada um, ela se esconde em um canto diferente. Cada um de nós será um leitor particular. Não há quem possa dizer a nossos filhos onde eles encontrarão a sua porta, Quem tem dois filhos como eu, ou lida com muitas crianças, como os professores, percebe que os livros falam de forma diferente a cada um deles. O dinheiro, tenho certeza, será mais útil se usado para facilitar o acesso das crianças e dos jovens leitores ao maior número de livros possível. Estes livros podem ser achados em bibliotecas, nas escolas, nos acervos de família ou mesmo comprados nas livrarias e nos sebos. Quanto mais livros pudermos apresentar a nossos filhos, mais possibilidade teremos de eles encontrem em si o lugar onde a porta da leitura está escondida. Uma vez aberta, não há quem não queira atravessá-la. Assim, foi com Maksim Górki (1868-1936), o escritor russo comprometido com a Revolução Soviética de 17, que conta no primeiro livro de sua trilogia autobiográfica a relação de afeto que mantinha com a avó, em ambiente marcado pela violência, e o primeiro contato com os livros em um navio, onde trabalhava como lavador de pratos. Os livros emprestados pelo cozinheiro abriram a porta por onde Górki atravessou até achar seu novo lugar no mundo. Assim, também foi com Graciliano Ramos (1892-1953), escritor nordestino também comprometido com o comunismo de meados do século XX, que superou a aridez e a violência de sua infância ao  encontrar na biblioteca do tabelião Jerônimo Barreto a sua porta para vencer a realidade que o oprimia. Górki e Graciliano nos mostram, nos belos romances em que visitam sua infância, que encontrar a porta da leitura é um grande desafio, mas que, uma vez vencido, nos abre caminhos nunca dantes imaginados. O que nos resta é paciência para ajudar nossos filhos a conseguirem encontrar, em si, a porta a ser aberta pela literatura.

Um comentário:

  1. Lu, é mesmo um debate que nos abre muitas portas de possibilidades, de opiniões. Coloquei o teu link lá no final do post. Vamos trazer mais pessoas para a reflexão e muitos caminhos para a leitura!
    Adorei a tua opinião. Beijo

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