quarta-feira, 18 de setembro de 2013
Liberdade é escolher sem a pressão do vendedor
Estou há muito tempo planejando escrever sobre minha adesão à campanha a favor do Projeto de Lei 5921, que visa regular a publicidade infantil no país, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, e o combate ao consumismo infantil. Vocês já devem ter notado, aí ao lado, o selo da campanha Infância livre de consumismo e o link para o importante documentário Criança, a alma do negócio. Essa é uma questão que de fato me preocupa. Tenho dois filhos, um quase adolescente e outro ainda pequeno, que, como todas as crianças brasileiras, estão muito expostos aos apelos do consumo. Eu e meu marido lutamos diariamente contra esses apelos e nos questionamos sobre o que é de fato necessário para o bem estar deles. Este exercício nos leva a algumas regras, que vamos buscar na nossa infância. Sapatos têm um número limitado em nossa casa. Cada um deles têm apenas uma chuteira, um tênis e um chinelo que só são trocados quando acabam ou quando o pé cresce. O mesmo critério vale para a calça e a bermuda jeans. Já a soma das outras peças de roupa - do que ganham, do que compramos e do que as avós fazem para eles, confesso, acaba extrapolando o necessário. Mas também não há nenhuma extravagância, como peças de grifes ou inadequadas para a idade deles. Os brinquedos foram aos poucos sendo eliminados de nossas listas de compras. Os eletrônicos, sempre desejados, são os presentes especiais, ganhos nos aniversários ou no Natal, quando servem aos dois. Mas só cedemos a estes pedidos, depois de muito desejados - para evitar um pedido novo a cada lançamento da versão mais moderna, e se estiverem de acordo com a idade deles. As exceções ficam por conta daqueles que eles compram com o dinheiro deles, que economizam no dia a dia. Mesmo assim nem tudo lhes é permitido com esse dinheiro, afinal, eles devem entender que ele foi fruto de muito esforço e, portanto, não deve ser gasto com qualquer coisa. Os livros são um capítulo a parte. Ficam na conta do consumo da mãe e do pai. Todos os que eles desejam e pedem eu compro, com exceção daqueles livros-brinquedo produzidos apenas para acender o desejo das crianças. Nego sem culpa, já que acho que eles devem entender que nem tudo vale a pena ser comprado, mesmo que seja um consumo cultural. Sobre esses, eu os convenço a não levar, argumentando que são bacanas só de olhar e tocar e que, rapidamente, serão deixados de lado. As histórias não. Elas estão sempre lá, nos esperando para uma nova leitura ou um novo olhar. Histórias que, na maioria das vezes, são escolhidas por mim e apresentadas a eles em nossas leituras noturnas. Não é hábito aqui em casa sair com as crianças para compras. Sejam elas da natureza que for. Isso evita que eu e o Cadoca sejamos bombardeados com pedidos, que vão desde o chocolate no supermercado, à bola de futebol do torneio da hora, passando pelos livros com música e dobraduras, sempre os mais expostos nas seções infantis das livrarias. Estas restrições, estou certa, não impedem que eles tenham liberdade para escolher suas leituras. Eles têm acesso a uma bela biblioteca na escola, onde podem pegar emprestado o livro que escolherem, além de muitos aqui em casa, o que é mais do que suficiente para apresentar a criança à literatura. Até porque não era diferente disso em um tempo que as pessoas que viviam em ambientes letrados, liam muito mais do que hoje, mesmo comprando menos. Eu, por exemplo, me tornei leitora, lendo apenas o que havia na minha casa, na casa dos meus avós ou nas bibliotecas a que tinha acesso. Quantos são os relatos de escritores que contam ter descoberto a magia da literatura no contato com o acervo de uma pessoa próxima. Não é preciso ter acesso a tudo para descobrir a porta a ser aberta pela literatura. É preciso apenas estar sempre tentando e as livrarias, como são hoje, pouco colaboram neste esforço. A maioria delas, vende livro para crianças como se fosse bala, apelando para cores e sabores artificiais que, poucas vezes, trazem histórias que valem ser contadas. Assim, mesmo contrariando o senso comum de que devemos levar nossos filhos a livrarias para eles próprios escolherem seus livros, continuo investindo em ter um acervo de qualidade em casa para que eles possam escolher suas leituras livres das estratégias de venda. Tenho certeza de que um dia, como aconteceu comigo, eles poderão frequentar livrarias e comprar seus livros, com seu próprio dinheiro e livres da pressão do vendedor. Até lá, continuamos a ler todas as noites aqui em casa, tentando, acertando e errando neste difícil desafio que é consumir sem consumismo.
É mesmo muito importante passar às crianças que livro não vem só das livrarias. Vem dos amigos, dos pais, da biblioteca da escola, do bairro. Livro vem de todo lugar. :-) Abraço.
ResponderExcluirLuciana, esse documentário Criança a alma do negócio é extraordinário. Abre os olhos para os ardis que podemos cair juntamente com as crianças.
ResponderExcluirSobre livros de ler, nem deveria escrever assim, mas devido a imensa quantidade dos livros para apertar, apitar e a história fica esquecida... tive uma triste experiência e constatação quando meu filho estava na educação infantil e havia a ciranda do livro toda semana. Títulos livres e sem orientação. Triste ver o que vinha para casa.
Talvez pais na melhor das intenções, ao ir para uma livraria para comprar um livro se deparava com a prateleira dos chamados lúdicos e orientação errônea dos vendedores.
O que poderia ter sido uma troca enriquecedora foi na verdade frustante.
beijo!
Adorei o post, Lu. O consumismo sempre foi uma preocupação minha, e é muito triste vê-lo refletido nos livros infantis também. Perceber as pessoas privilegiando livros puramente comerciais em detrimento a boas histórias é realmente doloroso. Mas enfim, acho que podemos contribuir um pouco, nem que seja incutindo o prazer da leitura nos nossos filhos.
ResponderExcluirbjs,
Mirtes Aquino