Meu caro, Helme Heine,
Sei que você está longe, na Nova Zelândia, escrevendo e cuidando de um lindo jardim à beira-mar, e que eu, com o meu português, provavelmente não poderei fazer-me escutar por ti. Mas, mesmo assim, te escrevo para contar do amor de meu filho Antônio por um de seus livros, o Diabolim, que, por aqui, foi editado pela Martins Fontes. O Antônio tem apenas seis anos e uma bruta imaginação. Ele ama belas histórias e desenhos, como há nos seus livros. Já lemos juntos e amamos alguns - é bom registrar, mas nenhum deles ganhou lugar tão privilegiado no imaginário do meu filho, como foi o caso de Diabolim. Seu diabinho, com cara de cãozinho de estimação e seu ameaçador tridente, já nos é íntimo. Há quase um mês, lemos todas as noites a história de afirmação deste anjo caído, que sonha em ser amado pelas pessoas que o rejeitam por ser peralta, implicante, atrapalhado e amalucado. Nós, lhe garanto, o amamos mesmo torto. Seria até mais honesto dizer que o amamos por ser torto. Torto como o Antônio e seu irmão, Pedro. Torto e do bem, como toda criança livre. Jogue a primeira pedra quem nunca foi, um dia apenas, um Diabolim na vida de alguém. Como disse uma professora do colégio dos meus filhos, as crianças tortas são fascinantes, como o seu Diabolim o é. Seu personagem nos permite voos para além de sua história, voos que nos acendem lembranças de outros tempos, em que também podíamos ser tortos, e de outros diabinhos que esbarramos na vida. A implicância de Diabolim com o padre e os anjinhos me fez lembrar ainda uma deliciosa história de Giovanni Guareschi, que li há anos atrás, por influência de minha mãe, sobre a tumultuada relação entre Don Camillo, um padre de uma pequena comuna italiana, e Peppone, o prefeito comunista, dois arqui-inimigos que haviam sido super-amigos na infância. Confesso que amo este humor europeu, que humaniza deus e o diabo, e nos garante boas risada. Nada pior do que a caretice e o preconceito que nos fazem calar. Seu Diabolim é uma palavra e desenho contra a caretice. Nos faz crer que a vida pode ser policromática, como suas ilustrações, e que podemos ter mil possibilidades, como seu diabinho. Ele é torto, mas é do bem. Por isso, o amamos. Obrigado por mais este livro. De seus fãs, Luciana e Antônio.
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