quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

O mundo encantado de Monteiro Lobato

Ler para um filho é como plantar uma árvore na esperança de usufruir de sombra no futuro. Uma sombra que recairá sobre outro, mas que, mesmo assim, nos refrescará. Uma sombra formada pelos anos passados ao lado dos filhos. Anos em que curtimos cada dia como se fosse o único e em que sonhamos com o futuro, com nossos meninos crescidos, valorosos e felizes. Anos em que cada minuto dessa convivência deixa alguma coisa para ser vivida depois, memórias, valores e afetos. Os livros, acredito, nos ajudam neste caminho desbravado ano a ano e que não sabemos ao certo onde vai dar. Como as pedrinhas de João, irmão de Maria, os livros nos dão o norte e a sorte de olhar para o mundo por uma janela muito maior do que nossos olhos poderiam abrir. Ver nos olhos dos nossos filhos o espanto com a descoberta, a curiosidade que os leva adiante e o prazer com uma bela história é uma experiência que nos une ainda mais a eles. Participar destes momentos de desabrochar para o mundo é um privilégio dado apenas aqueles que se dedicam a falar com as crianças. Monteiro Lobato, com certeza, sabia disso. Tanto que em suas histórias, recheadas do fantástico, nunca esquece de falar sobre as coisas da vida. Em O saci, de 1921, Lobato aproveita o encontro de Pedrinho com o Saci para questionar a crença da superioridade do homem sobre os outros seres vivos e fazer um pequeno inventário dos seres mitológicos do interior do Brasil. Pedrinho e o Saci travam longos debates sobre o que é mais valoroso, a inteligência humana ou os instintos animais e vão explorando a floresta e conhecendo seus seres reais e mitológicos. Pedrinho fica embatucado com tanta informação, mas mantém-se firme em sua posição de homem-branco-sempre-no-comando. Saci, com sua irreverência, vai fincando claves nas convicções de Pedrinho e fazendo nossas crianças pensarem sobre como o ser humano é pequeno diante da natureza. "Mãe, o que o Saci disse é verdade", quis saber o meu Pedro. A história está encantando noite a noite meus dois filhos. Na verdade, a escolha de O saci foi uma forma de dar ao Antônio, com seus cinco anos, a oportunidade de ler um livro em capítulos, como tenho feito com o Pedro, prestes a completar 11. No fim, o que aconteceu é que o Pedro passou a acompanhar com uma enorme atenção o livro e a abrir mão de ler o seu para ouvir mais capítulos de O saci. O Antônio, um apaixonado pelo Saci e outros seres mitológicos, está acompanhando com a maior atenção a história e aguardando com paciência a hora de degustar uma das lindas e poucas ilustrações que há na edição da Brasiliense, que estou lendo para eles. "Mãe, estou ouvindo a história, tá?! Quando tiver uma figura, me avisa", me pede, se aninhando no travesseiro, temendo perder as ilustrações de Manoel Victor Filho que retratam o encontro de Pedrinho com o Saci, a onça, a Iara, etc. Apesar de haver nova edição no mercado, com projeto gráfico moderno, preferi usar no blog a antiga por gostar mais da cara dos habitantes do Sítio do Pica-Pau Amarelo idealizada por Victor Filho e por tê-la como referência da minha infância. Assim, vamos seguindo lendo O Saci para finalmente entrarmos no mundo encantado de Monteiro Lobato, rejeitado pelo Pedro quando pequeno por seus volumes não serem livros ilustrados. Nossa sorte é que o Antônio topou de cara ouvir a história do Saci apenas com a imaginação. Ganhamos todos. Meus filhos, que descobrem um Brasil encantado nas histórias de Lobato, e eu, que, adulta, reaprendo a olhar o mundo com o espanto das crianças.