domingo, 16 de agosto de 2015

Um livro para provocar o pequeno leitor

Por mais estranho que possa parecer livro bom nem sempre agrada de cara o leitor. Muitas vezes incomoda, cutuca, irrita, até que, por fim, o leitor cai de amores por ele. Pois é, isso acontece com adultos e crianças que, muitas vezes, olham desconfiados para uma capa ou mesmo desistem depois de umas páginas de leitura. Mas um dia, sem mais nem porque, o livro está lá, esperando para ser lido, o leitor o tira da estante, o folheia e resolve lê-lo. E não é que agrada! Quantas vezes isso já aconteceu? Tantas e com tantas pessoas que não é possível contá-las. Outro dia foi aqui em casa. Eu, toda animada, cheguei para o Antônio com um livro que acabara de comprar. "Olha aqui que legal", disse, mostrando uma capa branca, com o título O livro sem figuras em preto. O Antônio olhou, leu e disse. "Não quero." Certa de que valeria a pena a leitura, insisti. "É um livro sem figuras, mas é muito legal." Antônio, cabeça dura como é, bateu o pé que não queria. Eu, como muitas vezes as mães fazem, fiz ouvidos moucos e comecei a ler, com a promessa de que se ele não gostasse, leria um outro livro. Comecei. Passei a primeira página, em que o autor, B. J. Novak, avisa que o livro não tem figuras, a segunda em que ele fala que o leitor pode achar que por isso ele não terá graça e nada. O Antônio continuava de costas para mim, mostrando que o ignorava solenemente aquele livro sem figuras e graça. Mas não desisti. A medida que fui avançando na leitura e chegando à parte em que Novak resolve pegar no pé de seu arredio leitor, ele foi se virando, vez ou outra, querendo ver como o livro sem figuras apresentada as palavras e prestando atenção. O livro não tem figuras, é certo, seu projeto gráfico, por saber disso, não deixa a criança cair na monotonia e aumenta e diminui o tipo das letras, que, de acordo com a intenção do autor, vão se colorindo e mexendo na página. Enquanto isso, as palavras vão ganhando vida para prender a atenção da criança. O Antônio foi seguindo, foi olhando, foi ouvindo, foi pensando até que, ao fim, com uma cara de quem não tem muita certeza do que vai falar, deu seu veredito. "É chato. Quero outra história." Como o prometido, li outro livro que, agora, ele escolhera, mas não me arrependi nem um minuto de ter lhe apresentado O livro sem figuras, que desafia o pequeno leitor, acostumado com a beleza das ilustrações e a criatividade de projetos gráficos feitos para agradá-lo, a ler o que lhe parece estranho. Nem sempre o novo nos cai bem, mas, não tenho dúvidas, nos dá novas possibilidades de ler o mundo. E, quando se é criança, nada mais divertido do que olhar para o mundo através de um caleidoscópio e ver diante de si vários retalhos do que um dia vamos chamar de realidade.
Se quiser ouvir o comentário sobre o livro na Rádio BandNews FM do Rio, clique aqui.

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