quarta-feira, 12 de maio de 2010

A dor de cada um

A literatura para o Pedro ainda é uma experiência compartilhada com os adultos. Apesar de ele, com seus 8 anos, já ser capaz de ler, a gente lá em casa ainda tem a prática de levá-lo para a cama com a promessa de uma história. Histórias que ultimamente são escolhidas, na maioria das vezes, pelo próprio, que garante, desta forma, a repetição de seus livros preferidos. A apresentação de novidades fica, assim, bastante prejudicada. Conto com um cochilo do Pedro para sacar de uma nova história para experimentar a leitura com ele. Em muitos destes momentos cogito escolher uma história de Lygia Bojunga, escritora que a cada livro que leio gosto mais. Apesar disso, sempre a deixo de lado. São dois os motivos para esta hesitação. O primeiro é eu achar o Pedro ainda muito novo para a maioria  das histórias de Lygia. O outro é eu sentir um desconforto ao pensar em ler para meu filho narrativas tão intimistas, que tratam de crianças em diálogo com seu mundo interior para superar seus conflitos com os adultos e com a realidade. Ler Lygia Bojunga para meu filho me soa como uma invasão de privacidade, como uma tentativa indevida de bisbilhotar os sentimentos mais íntimos dele. Me perguntam se não poderia ser diferente, se eu não poderia já apresentar-lhe algumas destas histórias sem fazer comentários. Talvez, mas acho que prefiro que o Pedro tenha esta experiência no momento que escolher e sozinho. Sozinho para pensar em como nós adultos lhe caímos na alma, no que lhe falta e no que lhe sobra na vida. Assim como o menino protagonista de Seis vezes Lucas, de 1995, teve que romper o silêncio interior para entender seu isolamento e aceitar que a história de seus pais - indiferentes a seus desejos e dores - não lhe pertencia para finalmente poder crescer. Acredito que o Pedro também vai crescer quando se deparar sozinho com suas questões. Uma solidão que pode estar assistida por mim e pelo pai dele para que, ao contrário dos pais de Lucas, nós possamos entender seu mal-estar e lhe estender a mão. 
PS: A capa (na foto), assinada por Roger Mello, é da primeira edição. Hoje, o livro é publicado pela Casa Lygia Bojunga Editora. Seis vezes Lucas recebeu os prêmios Jabuti e Orígens Lessa, da FNLIJ, e o selo de altamente recomendável da FNLIJ.