domingo, 30 de outubro de 2011

Um pirata em busca de seu tesouro

Um pirata muito só, de Denise Crispun, com ilustrações de Mariana Massarani, editado pela Escrita Fina, foi uma grata surpresa. Há muito tempo sei que ela é dramaturga e roteirista de TV e agora me surpreendo com sua produção para crianças. Denise, que é uma companheira querida de muitos carnavais, guardou o livro alguns anos na gaveta antes de publicá-lo. Que bom que o trouxe à luz! A história do pirata muito só em busca de seu tesouro foi escrita para sua filha Elisa, hoje uma adolescente, e é contada em um texto delicado, que ganha cores vibrantes nas belas e criativas ilustrações de Mariana Massarani que ajudam as crianças menores a acompanhar a saga do pirata. O mais bacana é chegar ao fim do livro e saber que o tesouro do pirata é o amor e não um baú cheio de moedas de ouro, que, nos dias de hoje, as vezes parece valer mais do que um belo encontro. O meu Antônio, para quem Denise autografou o livro, adorou a história do "pirata de um olho só, uma orelha só, uma narina só, um braço só, uma perna só, um joelho só, um sovaco só, um cotovelo só, uma bochecha só" e, segundo o Antônio, um pé só. O livro ainda tem a graça de apresentar, na penúltima página, os desenhos feitos por Elisa, ainda criança, para a história de sua mãe, dona de um fino senso de humor e alegria que esbanja todos os anos na ala dos fundadores do bloco Suvaco do Cristo. Com certeza, uma autora que vale a pena conhecer.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Na mesa, o macarrão de Tomie de Paola

Ainda criança aprendi a amar macarrão. Macarrão de todos os tipos, servidos a qualquer hora. Minha avó, Glória, era uma craque na cozinha e teve seu tempo de produzir até a massa que servia na mesa farta de sua casa. Eu não lembro da massa feita por ela, mas lembro de sua paixão por macarrão, pizzas - essas sim, feitas em casa - e sopas que herdou de seus pais italianos. Meu pai encarregou-se de fazer o macarrão ter presença certa na minha casa. Por muito tempo, quando pesava menos de 50 quilos e não podia doar sangue - ai que saudades! - eu comia todas as noites um prato de cabelinho de anjo, com manteiga e queijo parmesão, antes de dormir. O tempo passou, me credenciei para doar sangue e a classe média carioca passou a tratar nosso velho macarrão por massa. Mas eu continuei apaixonada por macarrão de todos os tipos, com qualquer molho. Tanto que, todos os meses, faço uma compra apenas de massa italiana. Spagheti, penne, farfalli. fettuccine e fusilli. O consumo aqui em casa é grande. Meus filhos, como eu, adoram uma massinha. Talvez por isso a história Strega Nona, a avó feiticeira, de Tomie de Paola, editada pela Global, tenha nos cativado logo de cara. Nós conhecemos a história - um conto tradicional italiano recontado pelo premiado autor americano - através dos tapetes do grupo Costurando Histórias. Aliás, tem tudo a ver a história com o trabalho da troupe da Daniela Fossaluza. Strega Nona, com aquele narigão das italianas, tem um belo caldeirão mágico que faz pulular macarrão tão logo ela canta uma canção. Mas o caldeirão é só dela. Strega Nona avisa logo a Tonhão, seu ajudante. O rapaz, muito intrometido e ambicioso, no entanto, logo desobedece a Nona e experimenta algumas horas de glória, em sua pequena vila italiana. Até que chega a hora da verdade e Tonhão, sem saber os truques da Nona, se vê na maior enrascada, com o macarrão saindo sem parar do caldeirão. A velhinha o salva, mas o faz pagar por seu crime à altura. O rapaz é obrigado a comer todo o macarrão. Nem tal mal assim, não é?
Olha o desenho animado da história, que faz parte da coleção Crianças Criativas, da Global. A coleção é coordenada por Gian Calvi, que, inclusive, assina a tradução de Strega Nona. Não encontrei uma versão dublada, mas o Antônio adorou ver mesmo em inglês. Como ele já conhecia a história, eu o ajudei a acompanhar a animação. Vale a pena ver a versão em vídeo da história, que recebeu vários prêmios nos EUA. No Brasil, ganhou o selo altamente recomendável da Fundação Nacional do Livro Infanto-Juvenil (FNLIJ). Aproveite!

sábado, 22 de outubro de 2011

Um céu de estrelas para um conto de amor

Eu sempre adorei mitologia grega e seu universo de deuses e semideuses. Na minha infância e adolescência, li e reli livros em que os principais personagens da mitologia grega eram apresentados. Sonhava, ao ver programas de TV que propunham viagens no tempo, viver na Grécia de belos homens e mulheres convivendo com os deuses em histórias heróicas. Mas somente quando cresci e entrei na faculdade, entendi que era através desses mitos que os gregos organizavam simbolicamente o mundo dos mortais. Aquelas histórias fantásticas davam corpo aos valores que lhes eram caros e às condutas desprezíveis. Foi então que aquele encantamento juvenil me ajudou a começar a desvendar o mundo em que eu vivia, herdeiro daquela tradições. Não à toa, assim que o Pedro cresceu um pouquinho, passei a comprar livros com adaptações dos mitos gregos para crianças. Até que um dia me deparei na estante de uma livraria com Psiquê, de Angela Lago, editado pela Cosac Naify. O livro era recém lançado e me encantou, apesar da quase certeza de que o Pedro não se interessaria por ele. Comprei-o como um presente para mim mesma. A história da bela princesa que desperta a ira da deusa Afrodite e, depois de enfrentar os abismos da alma e a morte, acaba conquistando o coração de Eros não tem idade. Na versão de  Angela, ganha contornos ainda mais belos, com sua prosa e ilustração que criam uma atmosfera de sonho e fantasia, como pano de fundo para o enlace da alma com o amor. O li e guardei-o na estante do quarto dos meninos sem dividi-lo com o Pedro, que o rejeitou de imediato. Meses depois, há poucos dias, lendo para os dois à noite, peguei o livro e comecei a leitura que logo prendeu a atenção do meu mais velho. Contei a história no ritmo de sonho proposto pela autora e o Pedro a acompanhou interessado. Ao fim, ele disse apenas que a história era linda. Disse pouco e tudo. Assim, como Adélia Prado, em seu breve comentário na quarta capa do livro, disse: "Como é possível alguém perfurar um papel de fundo preto e me obrigar a dizer: é um céu estrelado". Assim é a fantasia proposta pela mitologia - imediata e profunda.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A história se repete

É impressionante como esse país não muda. Outro dia, estava lendo com o Pedro Ludi na Revolta da Vacina, da minha xará Luciana Sandroni, editado pela Salamandra, e comentei com ele sobre as semelhanças do bota-abaixo do Pereira Passos com a política de remoção do atual prefeito do Rio. Ludi e sua família - na viagem que fazem ao Rio do início do século XX - ficam chocados com a violência com que Pereira Passos derruba os cortiços da cidade e desapropria lojas e residências na Avenida Central, em nome de um projeto modernizador para a cidade, inspirado em Paris. Pereira Passos, em sua arrogância, não consegue ouvir o pai de Ludi alertar para o fato de que seu projeto não seria o último a mudar a cara do Rio. Décadas mais tarde, o Rio perderia o Palácio Monroe, um dos marcos do Rio parisiente, para dar lugar ao Metrô, entre outros vários prédios do início do século. Os pobres de Pereira Passos deixaram os cortiços, naqueles dias vividos pela família de Ludi, e subiram morros e ocuparam terrenos em áreas desvalorizadas da cidade. Quase um século depois, o Rio andou para a Zona Oeste, descobriu a beleza das encostas e quis de novo esses lugares para integrá-los à cidade formal. OK! Nada contra, desde que os pobres que hoje ocupam os lugares dantes desprezados sejam também integrados à cidade formal. Mas não! A parte que cabe a eles nesse projeto de modernização e embelezamento da cidade é uma pequena indenização pela derrubada de suas casas, que, segundo a ONU, tem sido feita de forma a violar os diretos humanos por não lhes dar tempo suficiente para prepararem sua saída e não lhes oferecer alternativa de moradia. O Pedro se espantou. Ele que, nesses dias na escola, aprendeu a se condoer com o  drama das famílias brasileiras que foram obrigadas a deixar suas casas para a corte de Dom João e com o bota-abaixo de Pereira Passos, me perguntou o porquê disso tudo novamente. Tudo em nome de uma modernização conservadora e excludente que, de tempos em tempos, empurra a pobreza para fora da cidade formal. É, como diria Marx, a história se repete e, ao que parece, pelas obras que herdaremos da preparação da cidade para as Olimpíadas, mais uma vez como farsa.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

O encantamento de Sylvia Orthof

É muito bom quando a gente pega um livro e se encanta por ele, como me aconteceu com Fada Cisco Quase Nada, de Sylvia Orthof, editado pela Ática. O Antônio chegou em casa da escola com o livro da ciranda e logo me pediu para lê-lo. Senti de imediato que aquela história era especial. Nem sempre os livros da ciranda o animam dessa forma. A maioria deles é preterida por ele, que sempre quer ler os seus próprios. Mas a Fada Cisco chamou sua atenção. Tão logo comecei a ler a história de Sylvia Orthof entendi o encantamento do meu filho, tão pequeno como a fadinha que ganha vida nas cores de Eva Furnari. Cisco traz em si a essência da infância tão bem contada na obra de Sylvia, uma de nossas grandes autoras de literatura infantil e juvenil. Uma essência que, segundo Sylvia, pode ser entendida por gente de todas as idades. "A rosa é encantada: só se abre para quem sabe que sempre é tempo de fada", garante ela ao apresentar a morada da fadinha. Passear pela casa da Cisco é outro grande barato do livro que se deve ao rico diálogo entre ilustração e texto. Acompanhar a história de Sylvia de olho nas ilustrações de Eva foi um desafio que encantou o Antônio e a mim, que descobri, com a leitura, que meu filhote já é capaz de ligar ao concreto abstrações - como meia, chulé e pé - e acompanhar sem perder detalhes uma história tão rica quanto a da fada cisco. Ao fim de quase 10 leituras em apenas dois dias, partilhei com o Antônio a certeza de que a Fada Cisco é mesmo muito especial, tanto que ele  chorou quando eu disse que tínhamos que devolver o livro para a escola. Tomara que a Fada Cisco volte para meu pequeno Antônio no fim do ano!