quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O maravilhoso amor de irmão

A maravilhosa ponte do meu rimão/irmão, de Ana Maria Machado, editado pela Objetiva, é um velho conhecido meu e do Pedro. Ganhei o livro de uma amiga querida, a Leni, que não está mais entre nós, quando o Antônio ainda era um bebezinho e nenhuma ponte o cativava. O Pedro adorava a história, talvez antevendo o amor e admiração que o irmão teria por ele anos mais tarde. Lemos várias vezes até que um dia, sem razão aparente, o livro ficou de lado na estante enquanto meus filhos cresciam. Pedro, nestes anos, foi deixando de ser criança para começar a se arriscar em um mundo em que as pontes só o ligam a meninas, ao rock e ao futebol. Antônio também cresceu, mas não o suficiente para descrer no maravilhoso. Para ele o mundo ainda é maravilhoso e senhor de mistérios que alimentam sua imaginação. Foi então que, ontem, em busca de uma novidade para ler para ele, lembrei da história e a busquei na estante. A ponte que me levou até o livro de Ana Maria Machado sobre o amor encantado de um irmão mais novo pelo mais velho, que o ensina as manhas da vida, foi o amor e o ódio que meus dois meninos vivem diariamente. O companheirismo é o combustível do amor que os une e o ciúme alimenta sem pudores o ódio experimentado pelos dois. Tanto que outro dia, flagrei no caderno do Pedro uma linha do tempo que indicava 2002 como o ano de seu nascimento e 2007, como o pior ano de sua vida, por causa do nascimento do irmão. Não foi nenhum choque, apenas ri. Conviver com um irmão nem sempre é fácil. Mas tenho certeza é uma das experiências mais ricas na vida de uma criança. Aprender a dividir, a compartilhar, a disputar, a brigar, a se defender, a azucrinar, a lidar com o ciúme, a amar e, sobretudo, a amar um tão próximo. Nada fácil, sei bem, eu que sou a do meio em uma família de três filhos, mas, diria, quase fundamental para a formação de um adulto disposto a partilhar sua vida com alguém. Essa experiência, acredito, fica ainda melhor quando os pais atuam para evitar os abusos cometido pelos mais fortes ou mais manipuladores, mas não impedem os irmãos de viverem seus conflitos. Aqui em casa, recentemente, tivemos que intervir para fazer o Pedro parar de se divertir em falar para o irmão que eu sumiria ou morreria, deixando-os sozinhos. Um dia o Antônio teve um ataque histérico na casa da avó, com medo de eu não voltar, que revelou o mal que o irmão estava fazendo a ele. O Pedro, assim que soube do efeito de sua brincadeira de péssimo gosto, chorou, dizendo que amava o irmão e que não fizera por mal. Sabemos que foi inconsequentemente por mal. Que ele é inevitável na relação de dois irmãos e que nem mesmo os pais podem evitar estas agruras. Querer irmãos sempre amáveis é plantar conflitos para o futuro. Na vida é preciso poder amar e odiar ao mesmo tempo. É da vida amar o irmão mais velho, que é exemplo e protetor, e odiá-lo por sempre levar a pior. Assim com amar o irmão mais novo, seu companheiro fiel, e odiá-lo por roubar seu espaço é um enredo clássico. Ana Maria Machado construiu uma bela relação entre os irmãos de sua história, onde não cabe nem mesmo a mãe, sempre alheia às razões deste amor. O que é maravilhoso no livro não é a ponte, mas o poder do amor entre irmãos tornar tudo maravilhoso, até mesmo um pedaço de madeira. Os dois meninos de A maravilhosa ponte de meu rimão/ irmão, amam acima de tudo, como o Pedro e o Antônio amam. Que assim possa ser para sempre.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Ri melhor quem ri por último

Não há como ficar indiferente a uma boa história de macaco. Eles são inteligentes como nós humanos, maliciosos como os piores de nós e engraçados como os melhores. Essa identificação quase que imediata que temos com os macacos faz com que sempre torçamos por eles. Estejam eles certos ou errados, como é o caso do macaco do conto O macaco e o bolo, que faz parte do livro Histórias da Onça e do Macaco, da premiada Vera do Val, editado pela Martins Fontes. O macaco é um tremendo 171 e, além disso, entrega para a morte sem dó, nem piedade cada um dos bichos que engambela. Enfim, um ser desprezível. Mas não há como não admirar sua inteligência, que o leva a vitória em todos os embates em que se mete. A onça é mais forte, mas, nas histórias brasileiras, ela nunca leva a melhor. O macaco sempre a vence para alegria do leitor. Vera do Val, a contista paulista que radicou-se na Amazônia, reuniu várias destas histórias, que têm origem no folclore africano ou indígena e que se tornaram brasileiríssimas. Ela, que dedica o livro aos netos, narra cada um dos contos como se estivesse frente a frente com seu leitor. Não há criança que não se encante com Histórias da Onça e do Macaco, mesmo que já conheça alguns dos contos reunidos por Vera. O livro não corre o risco de parecer dégà vu, já que cada um que conta um conto aumenta um ponto. O Pedro, mais velho, foi capaz de reconhecer as diferenças entre as várias versões que ele conhece do Bicho Folharal e do Macaco e a Velha e curti-las. O Antônio, que está descobrindo os contos tradicionais, gostou mesmo foi das macacadas em torno do bolo e dos bichos que comem uns aos outros. Eu, por minha vez, adorei, além dos contos é claro, as ilustrações de Geraldo Valério, um brasileiro radicado no Canadá que com suas colagens reproduziu o esplendor das cores da floresta. Floresta que nós brasileiros fomos invadindo aos poucos com nossas cidades. As onças, que estão ameaçadas até nas matas, se foram. Mas os macacos estão em toda a parte - andando pelos fios saídos dos postes, nas janelas mais próximas do verde e em nossos parques urbanos - tentando com poucos recursos tomar de volta o território que um dia foi deles.  Nós, com nossa força, estamos vencendo este embate, mas a vitória, tenho certeza, não nos será doce. Ri por último quem ri melhor. E o macaco sabe disso.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Um mistério que passa de geração em geração

Hoje estou voltando das férias. Não das minhas, mas dos meus filhos. Férias que me sugaram, que me tiraram qualquer tempinho que pudesse ser só meu. Tempo livre para fazer o que eu quisesse, inclusive, passar por aqui, onde não venho há pouco mais de um mês. Um mês em que pensei várias vezes em falar de O gênio do crime, de João Carlos Marinho, um clássico da literatura infanto-juvenil brasileira, que está nas livrarias há quase 40 anos encantando as crianças de várias gerações que topam compartilhar das aventuras da Turma do Gordo. Já são 60 edições e, pela vitalidade da história, estes números não vão parar por aí. O mistério de tanta longevidade, com certeza, está em uma narrativa bem amarrada da investigação acerca da falsificação de figurinhas de um álbum de futebol. Logo nas primeiras linhas vi que o Pedro, um aficionado por futebol que recentemente descobriu-se um amante de livros de mistério, tinha sido ganho para a história, que o fez retardar por alguns dias a hora de dormir. Bolachão é um menino gordo dotado de uma fina inteligência, que o leva a ser contratado pelo dono de uma fábrica de figurinhas para descobrir um falsário responsável por uma derrama de figurinhas premiadas no mercado. A partir daí desenrola-se uma excitante investigação que coloca em risco o menino e seus amigos. A narrativa de Marinho não se amesquinha para conquistar leitores mais preguiçosos. Pelo contrário, é rica em detalhes para delinear os personagens e criar o ambiente onde a história se desenrola. Além disso, ela não tem pena das crianças e as provoca a experimentar os mais terríveis sentimentos, como o medo da tortura e da morte, com a passagem em que Bolachão está em poder dos bandidos. Meu filho suou frio em vários momentos da narrativa, aumentando ainda mais seu interesse pelo livro. Marinho vai até o limite, fazendo o leitor crer que tudo é possível em sua trama. A trama policial é bem construída, nos dando pistas do desvendar do mistério, e convive com traços de humor na narrativa para aliviar a tensão do leitor ainda criança. Com certeza, Marinho não escreve para agradar, mas sim para inquietar. Tanto que o Pedro já está no terceiro livro da série, o premiado Sangue Fresco, em que a turma do Bolachão enfrenta um sequestrador de crianças e traficante de sangue humano. Que venham os outros livros com as aventuras da Turma do Gordo.