sábado, 14 de março de 2015

A vida e a morte, segundo Helme Heine

A morte é sempre um assunto difícil para qualquer idade. Quando eu era criança, a temia muito, assim como, de maneiras diferentes, meus filhos a temem. O Pedro sempre se emocionou com a morte. Não podia-se falar da chegada dela na vida de ninguém, uma pessoa real ou um personagem de livro, que deixava vazar toda a tristeza que pressentia sentir quando a morte chegasse para um de seus queridos. O Antônio, ainda hoje, se assusta muito com a existência dela. Tem medo que chegue em seu quarto à noite para o levar, como eu também tinha, ou que assombre seus pais ou seu irmão. Enfim, que mude sua vida. Sentimentos que, ao longo da vida, com tudo o que ela nos guarda de bom e de ruim, vamos começando a entender. Só a maturidade pode nos fazer conviver com a morte, por perceber que, um dia, ela vai chegar e que não, necessariamente, será ruim. Há as boas mortes. Aquelas que levam pessoas que viveram vidas felizes e foram capazes de construir laços afetivos, sentir o mundo que as rodeia, realizar muito e, porque não dizer, se frustrar um bocado. Lembro até hoje de uma amiga me contando a morte do pai, prestes a fazer 100 anos, que permitiu que ele se despedisse dos filhos, falasse que ai em paz, das coisas boas que a vida lhe deu, do amor que o uniu à mulher de sua vida, enfim, do que fez a vida valer ser vivida. Afinal, a morte, depois de muita vida, faz sentido e parece mais leve. Compreender isso, no entanto, não nos impede sofrer com a iminência dela ou com o fato consumado. Perder um amor, alguém da família ou um amigo querido é sempre uma dor. Não há como evitar a tristeza pela perda e o assombro pela lembrança de que ela está por aí e um dia pode nos encontrar. Este é momento pelo qual está passando meu pai, que, com 79 anos, viu o ano passado levar seu irmão mais velho e sua cunhada. Ao que parece a morte não lhe dará trégua. Esse ano, começou com a doença de seu outro irmão, que, aos poucos, se despede da vida, e a senilidade de seu melhor amigo, um  pouco mais novo, mas mais frágil de saúde. Eu e a minha mãe, preocupadas com o abatimento dele, chegamos a uma óbvia conclusão. A velhice não nos dá alternativa: ou a gente morre ou nos preparamos para a morte dos outros. Naturalizar a morte, sem que, com isso, precisemos reprimir nossa tristeza diante dela, talvez seja a maneira mais fácil de encará-la. E é assim que Helme Haine a apresenta para as crianças, em A turma, editada pela Martins Fontes. Como não podia deixar de ser, ele começa a falar da morte pela vida e por tudo que ela pode nos apresentar. E conta esta história por intermédio de três amigos inseparáveis dos seres humanos: Professor Cérebro, Rose Coração e Barrigão. Os três ficam com seus amigos até para além da morte. O Professor Cérebro se encarrega de manter cada um na memória de seus pares, Rose Coração cultiva os amores que cada um conquistou em vida e Barrigão não o abandona nem na morte, seguindo com ele. Tudo isso falado com tamanha naturalidade e poesia, que não há criança que não se apaixone por essa turma. Afinal, eles também são seus amigos. Para sempre!

2 comentários:

Ana Paula disse...

Há menos de um mês, meus filhos tiveram um real contato com a morte através do avô que se foi. Foi de uma morte boa aos quase 100 anos, o que torna mais suave esse momento.
Um assunto tão delicado de se abordar, especialmente com as crianças, que bom ser abordado na literatura infantil. A capa do livro, achei tão bonita, tão suave. Falar de morte com poesia, facilita.
Beijo Luciana!

Luciana Conti disse...

Os meus já passaram por isso. É sempre um espanto. Mas eles são capazes de superar. bjs