quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
Uma história para ler, brincar, experimentar e existir
A capa de Dia de pinguim, do autor e ilustrador ucraniano Valeri Gorbachev, é apenas um tira-gosto da delícia que nos espera no interior do livro, editado pela Companhia das Letrinhas. Delicadeza, lirismo e fantasia é o que nos dá Valeri com seu Tartaruguinha, protagonista da história, que se diverte experimentando novas possibilidades de existência. Mesmo que esta experimentação se dê apenas na fantasia, como em uma brincadeira. Tartaruguinha, que cisma ser um pinguim, é, na verdade, uma de nossas crianças travestida pelo recurso do antropomorfismo em um filhote de tartaruga. Aliás, o antropomorfismo que busca nos traços e características animais semelhanças com seres humanos é um recurso comum na obra de Valeri, que tem mais de 40 livros publicados, e mais ainda na história da literatura infantil. Não há como negar que um belo desenho de um animal vestido como gente nos invade de ternura, por mais que saibamos da nova tendência das ilustrações de bichos que fazem as vezes de homens, mulheres e crianças é apresentá-los em sua própria pele, apesar de eles continuarem agindo com a moral dos humanos. A ternura dos desenhos de Valeri está a serviço do elogio à imaginação e à fantasia que podem ser despertadas por uma boa história. Em Dia de Pinguim, o Tartaruguinha fica encantado com uma história de pinguins que seu pai lhe conta e resolve ser um deles, assim como o meu Antônio no processo de identificação com seus amigos quis até mudar de nome. Experimentar, isso que o personagem de Valeri e o meu filho quiseram com suas brincadeiras. Tartaruguinha ganhou toda a sua turma para sua brincadeira, já o Antônio arrumou a maior confusão ao decidir que se chamaria Lucas, assim como um de seus melhores amigos. Seus colegas embarcaram como puderam em sua fantasia e passaram a chamá-lo de Lucas Antônio, o que o desagradou sobremaneira. Teve choro, vela e muita reclamação até ele entender que é melhor vivermos sozinhos algumas fantasias para evitar o risco de confundir quem está de fora de nossa viagem. Já o Tartaruguinho, com a ajuda do livro de seu pai, conseguiu levar todos os seus amigos para sua viagem. Os amigos e os leitores de Valeri. Acho que vou sonhar que sou uma tartaruguinha. E você?
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
Natal é tempo de renascimento
Hoje é Natal! Queria ter escrito antes para desejar a todos um feliz dia, mas me enrolei e meus votos vão agora, quase na hora da ceia. Votos de quem não acredita mais em Papai Noel, mas continua acreditando que a vida pode ser bem melhor e será. A menina de Andersen também! Apesar de todo o sofrimento, ele aposta no futuro. Ela nos ensina a estender a mão a quem sofre e, mesmo se não chegar ajuda, a superar nossas próprias dores. Afinal, Natal é tempo de nascimento e, por que não, de renascimento. Assim espero que seja para todos nós.
quarta-feira, 12 de dezembro de 2012
Um leão feito de medo e de coragem
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
Glória às crianças, aos loucos e aos artistas!
Meu pai sempre foi um aficionado por tirinhas e histórias em quadrinhos. Até hoje ele tem uma coleção delas em sua mesa de cabeceira para a noite. Ele lê quietinho, pitando um cigarro, o único do dia, antes de dormir. Ri das graças de personagens para crianças, como Tio Patinhas e Peninha, e de tirinhas para adultos, como as do nosso Henfil e de Calvin e Haroldo, do americano Bill Watterson. Desta paixão, herdei apenas o gosto pelas tirinhas, que falam das coisas da vida com o humor típico dos cartunistas. Um talento que invejo. O talento de falar pouco e falar tudo. O talento de desenhar em tão poucos traços a alegria, a tristeza, a indiferença, a surpresa, o ódio, o amor, enfim, as emoções que animam a vida. Não fosse isso o bastante, Watterson conseguiu falar do mundo dos adultos, em Calvin e Haroldo, com a lógica das crianças, como se não tivesse crescido. Este é o talento que mais invejo. Quem lembra de si, quando criança, ou convive muito com elas sabe que Calvin é um menino de verdade. Sua amizade com o tigre de pelúcia Haroldo é ainda mais. Aqui em casa, o Antônio tem o Otto, um cachorro amarelo, de orelhas compridas, feito de pano, que o acompanha e compartilha alguns de seus bons momentos na vida. Sua lógica também é muito parecida com a do Calvin e algumas de suas conclusões poderiam ser muito bem, se eu tivesse o talento de Watterson, transformadas em tirinhas de sucesso. Outro dia ele me apareceu vestido com uma camiseta do Calvin e Haroldo, presente do Cadoca, outro aficionado pela dupla, e um short floral de tons terrosos, dizendo orgulhoso que as peças estavam combinando. Eu, que ultimamente o tenho pressionado a combinar as roupas que escolhe para vestir, olhando a harmonia das cores, disse que sim. Foi então que ele me surpreendeu. "Olha só, mãe! O short é de flor, o menino gosta de flor e o tigre também. Por isso, está combinando, né?" Só me restou rir, como rio do Calvin e Haroldo. Com esta lógica ele agora explica todas as suas combinações, que deixaram de ser por cores e passaram a ser temáticas, como se suas vestimentas fizessem parte de uma narrativa ambulante. Uma delícia de visão de mundo que vamos perdendo à medida que crescemos. Na boca dos adultos, discursos como o do Antônio ou o da tirinha acima sobre o potencial literário da matemática, descolados da ordem das coisas, são imediatamente taxados de arte ou loucura. Mas podem também ser a razão oculta de daltônicos em sua tentativa de combinar roupas ou de alguém, como eu, ter se dado mal toda a vida nas provas de matemática. Uma pena que já não possamos mais proferi-los! Por isso, não nos restam alternativas a não ser dar vivas às crianças, aos loucos e aos artistas!
sábado, 24 de novembro de 2012
Uma esperança para Azzi
Confesso que não sou uma fã de histórias contadas em quadrinhos. Os quadrinhos para mim só são atraentes no caso das tirinhas. Aí poderia lembrar de vários personagens que me fizeram rir e pensar sobre a vida. Histórias em quadrinhos só lembro de ter gostado as de Asterix, de Albert Uderzo e René Goscinny, leitura frequente na casa dos meus pais. Mas, como para tudo na vida há exceções, me deparei outro dia com Um outro país para Azzi, da inglesa Sarah Garland, editado pela Pulo do Gato. A história de Azzi, nascida em um país qualquer conflagrado por uma guerra, é um drama contado de maneira a não colorir a realidade, mas, como não poderia deixar de ser, com o tom de esperança que devemos usar com as crianças. A menina vê a guerra se aproximar de sua casa e mudar a vida de sua família, que é obrigada a deixar seu país em busca de um lugar mais seguro. De casa, eles levam apenas um saco com feijões e uma manta tecida por sua avó amada que não partiu com eles. A viagem é dura e tensa e o lugar seguro não é sua casa. As pessoas deste lugar não falam sua língua, não têm seus costumes, não dão emprego a seu pai, médico. A família passa por momentos ruins, Azzi sofre a falta de casa, representada pela ausência da avó e por seu prato favorito - feijões picantes. A esperança de uma nova vida vem com a chegada da avó e uma pequena plantação de feijões na horta da escola, que lhe rende sementes para plantar em casa. O refúgio de Azzi não pode se transformar em sua casa, esse sofrimento ela não pode driblar, mas pode ser uma boa morada para sua família, mais uma vítima das tantas guerras que fazem sofrer milhões de pessoas em todo o mundo. A história é triste, sem dúvida, mas deve ser conhecida por nossas crianças, felizmente, tão distantes desses conflitos e tirá-las da ignorância que minha geração viveu na infância. Quando nasci, em 1965, os europeus ainda sofriam os efeitos das duas grandes guerras e conflitos localizados flagelavam populações do Oriente Médio, da África e da Ásia. Longe do palco de horrores, os meninos brasileiros, assim como os americanos, colecionavam soldadinhos de plástico, que vinham ensacados junto com seus companheiros de regimento, aviões de montar com modelos das duas grandes guerras e livros sobre as principais batalhas e máquinas de matar. As crianças se divertiam jogando longas partidas de War, em que o objetivo era ocupar territórios e dominar exércitos inimigos, e viam nos filmes americanos as aventuras de guerra, sem a fome, o medo e o sofrimento reais. Os conflitos seguiam na telona como mais uma brincadeira viril, uma batalha de vídeo-game, assim como a Guerra do Golfo foi apresentada, em 1990. Vozes dissonantes começaram a aparecer em filmes e fotografias que mostravam que os horrores da guerra não se resumiam à barbárie nazi-fascista. A guerra, por si só, era uma barbárie. Este despertar para a realidade fez começar a sumir dos quartos de crianças os soldadinhos e as máquinas de guerra, mas foi incapaz de frear a intolerância nacionalista, racial, étnica e religiosa que alimentam tantos conflitos e os poderes e interesses econômicos da indústria bélica. Todos os dias, em algum canto conflagrado do mundo, alguém, como Azzi, é violado em seus direitos mais básicos. Gerações crescem convivendo com a barbárie e milhões de pessoas são obrigadas a deixar seus países de origem para se refugiar dos horrores da guerra. Horrores que devem ser conhecidos por todos, inclusive por crianças mais crescidas que podem encontrar em histórias destas vítimas razões para viver em paz. Sei que a vida não é assim tão simples, que as mudanças sociais são muito mais complexas e dependem de muito mais do que apenas a vontade de cada um. Mas acredito que o primeiro passo para se viver em paz é odiar a guerra e militar pela paz. Odiar de verdade, de perto ou de longe, e conhecer o sofrimento de quem a vive é uma motivação para se dar este primeiro passo. Azzi pode servir de alerta ao revelar a vida de uma menina vítima da guerra que nos acostumamos a ver de longe, congelada no sofrimento patente em uma foto. Ao nos revelar que por trás da imagem de sofrimento há uma menina como as nossas crianças, apostando que a vida pode ser boa, sentimos um pouco a sua dor. Se identificar com a dor alheia é um bom começo para a fraternidade. Essa identificação, Sarah Garland, que escreveu o livro depois do contato com refugiados da Birmânia e Butão, em uma pequena cidade da Nova Zelândia, consegue provocar em sua narrativa. Quando chegamos ao fim da história só temos um desejo: que a vida de Azzi, como a de milhares de crianças refugiadas, possa ser boa apesar de tudo.
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Ser mãe e as coisas da vida
Os desenhos animados, desde que o Pedro nasceu, passaram a ser para mim um tormento repetido à exaustão. Mas, é claro, há exceções. Uma delas, o Irmão Urso, um filme da Disney, de 2003, sobre três irmãos diante de seus destinos, representados por totens. Kenai, o mais novo, recebe o totem do amor e, revoltado com o que considera um rebaixamento de sua condição masculina, o nega. Como nas tragédias, ele passa toda a história se aproximando, sem perceber, de seu destino, até que o compreende e o aceita. Bela história, que me fez perceber que o meu totem também é o amor, apesar de meu destino não ter sido traçado por forças sobrenaturais e poderosas, como o de Kenai. Meu totem não passa de uma escolha feita quando eu ainda era uma criança e sonhava em ter filhos e uma bela família. Sonho que me pareceu na adolescência menor do que o desejo de ter uma profissão, de me realizar no trabalho, enfim, de ser uma mulher emancipada e independente. Este desejo sobrepujou o outro e passei parte de minha vida adulta investindo no trabalho e nos prazeres de ser independente. Até que conheci o Cadoca, me apaixonei e um dia, sem planejar, me vi formando uma família com ele. Primeiro veio o Pedro e, cinco anos depois, o Antônio. Desde então, vivo, como muitas mães, dividida entre a vida profissional e os filhos. Não quero e nem posso deixar de trabalhar, afinal, o trabalho nos ajuda a compor nossa identidade. Mas quero poder viver estes dois papéis, o de mãe e o de profissional. Por isso, nestes últimos anos, tenho de tempos em tempos me reinventado para me manter no mercado e na vida deles. Agora vivo mais um momento de reinvenção. De início de novo caminho. De desafios por vir. De confiança no porvir. Confiança de que todo este esforço está valendo a pena. Um esforço para abrir em minha vida de mulher emancipada e independente espaço para duas criaturas que me ancoram no mundo, me projetando para o futuro e me levando a revisitar constantemente o passado. Mãe do jeito que sou hoje, serei por mais poucos anos. Depois meus filhos vão buscar seus caminhos e me deixar com o ninho vazio e, assim, terei cumprido com o meu destino de honrar o totem do amor. Nestes tempos de incerteza que vivemos, o amor é a única certeza. A certeza de uma sobrevida na memória de quem nos amou e de um lugar em um mundo cada vez mais fragmentado e descontinuado. Não sei onde vai dar minha história. Mas sei que o amor não se esvai. Sei que um dia meus filhos vão se lembrar de mim, mesmo depois de minha partida, e reconhecer um valor no esforço que faço hoje para tê-los ao meu lado. O valor do amor e a aposta em uma nova vida. Assim, como fizeram minha mãe, a mãe dela, minha avó querida, que já partiu, e gerações e gerações de mulheres que, apesar de sua importância social, foram massacradas por séculos e séculos. O meu desafio, como é o de muitas mulheres deste mundo afora, é viver assim entre a casa e a rua. Entre os filhos e o trabalho para deixar para eles a maior e melhor herança que alguém pode ter na vida: o amor. Amor herdado que me fez ficar com os olhos marejados ao ler Mari e as coisas da vida, da belga Tine Mortier, editado pela Pulo do Gato. O livro tem texto corajoso que fala, sob o ponto de vista de uma criança, de velhice, de doença e de morte como é raro ver na literatura para crianças e jovens, tão comumente temerosa com assuntos difíceis. A narrativa é uma emocionante história de amor de uma neta com sua avó, que me fez lembrar do meu amor pela minha avó Branca. A delicadeza da história é realçada pelas belíssimas ilustrações da também belga Kaatje Vermeire, que não temeu nem mesmo desenhar a cena do velório do avô da menina. A morte, no contexto da relação de Mari com a avó, é mais um momento da vida, com certeza, triste. É o fim esperado desde o começo, mas preenchido de sentido por uma vida vivida com amor. Este sentido minha avó Branca, que morreu serenamente em sua cama, cercada pelos objetos de toda uma vida e de sua filha, me ensinou com o amor que dispensou a seus filhos e seus netos. Mari me fez lembrar os momentos finais da vida da minha avó, que tanta tristeza me impuseram, e que só hoje, anos e dois filhos depois, consigo compreender e ressignificar. Este ressignificado eu encontrei na história de amor que vivi com ela. A única coisa sólida que ela me deixou. A única coisa sólida que deixarei para os meus. O mais, não tenho dúvidas, se desmancha no ar.
domingo, 18 de novembro de 2012
Amigos, para sempre amigos!
Eu queria ser o galo Juvenal para ficar com a cara assim exposta ao vento e seguir surfando no guidão de uma bicicleta, movida pelos meus dois melhores amigos - o rato Frederico e o porco Valdemar. Mas calei-me quando o Antônio me perguntou qual dos Amigos, do livro do alemão Helme Heine, editado pela Ática, eu queria ser. Afinal era uma história para amigos e não para família. Mãe quando se mete em história de amigos arruma uma terrível confusão. Antônio conformou-se com minha omissão e decidiu ser o rato Frederico. Investido no personagem de Heine, Antônio correu pelos campos com seus melhores amigos, explorou lagoas em navios piratas, pescou, dividiu o melhor e o pior de um jantar e, por fim, foi catar um lugar para dormir. Dormir junto com os amigos, como é o desejo de toda criança. Mas não deu. Não tinha nenhuma mãe para dizer não, mas a noite dos três amigos juntos não foi possível. Cada um foi para sua casa dormir e, que gostoso, sonhou estar de novo junto com seus companheiros. Perguntei ao Antônio se ele sonhava com seus amigos. A resposta foi surpreendente e uma delícia. "Mãe, sabe aquele dia em que troquei de nome? Sonhei que estava dando um soco no Vinícius porque ele me chamou de Lucas Antônio", contou. Dando um soco?! Logo o Antônio, que é o maior boa paz?! Logo no Vinícius, seu melhor amigo?! Pois é, um dia explico melhor. Mas o caso foi que o Antônio quis mudar seu nome para Lucas e os amigos na escola não toparam a história e passaram a lhe chamar pelo novo e pelo antigo nome. Magoado como o nome composto, resolveu sua parada no sonho. Liberou sua raiva, deu um soco no Vinícius e não perdeu o amigo! Tudo resolvido! Afinal, como diz Heine, amigos de verdade, ninguém pode separar.
PS: Não posso deixar de falar das ilustrações, do próprio autor, que reforçam a atmosfera delicada da história, com seus tons suaves e traços ternos.
PS: Não posso deixar de falar das ilustrações, do próprio autor, que reforçam a atmosfera delicada da história, com seus tons suaves e traços ternos.
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
Uma história para ser contada ou cantada
Um dos meus maiores prazeres é ver meus dois filhos se divertindo juntos e sabendo dividir. Dividir o amor dos pais, em primeiro lugar, os momentos da vida, em segundo, e os prazeres, por fim. Isso nem sempre é possível quando se é criança e se vive 24 horas lado a lado, mas quando acontece é um momento especial. Um momento que, aqui em casa, tem-se repetido nos últimos tempos na hora de dormir e ouvir uma história. O Pedro cede para o Antônio ouvir sua história e o Antônio, finalmente, aprendeu a ceder para o Pedro ouvir a sua. As do Antônio, em sua maioria, têm divertido muito o Pedro, que resolveu narrá-las de forma teatral e criar noites divertidas para todos nós. Sua primeira incursão no gênero foi com Pé de cobra, e asa de sapo e a performance continuou com Cadê o pintinho?, de Márcia Leite, editado pela Pulo do Gato e ilustrado por Anita Prades. O livro é uma delícia e tem ilustrações e projeto gráfico que colaboram para a graça do reconto da canção popular do Pintinho Piu. A cada página, Márcia traz um novo bicho da fazenda para procurar o pintinho e, aqui em casa, a farra se instala. O Antônio cata o pintinho no amontoado de bichos que Anita Prades, uma estudante de apenas 20 anos, novata na arte de ilustrar, dá divertida vida em suas belas ilustrações e o Pedro me chama a atenção para o fato de a cada novo personagem, o tipo das letras diminui para dar ideia de que algo se acrescenta na história. As páginas se sucedem em cores quentes e o branco do coletivo, até que, na última, todos os bichos estão a catar o pintinho, que aparece espantado no alto do amontoado deles. Para quem tem talento musical, tudo pode ser ainda mais divertido se for cantado em vez de contado. Mas eu, com certeza, não posso me arriscar na voz. Uma pena!
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
Lendo para os pais

quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Todos os dias ele lê tudo sempre igual
É isso aí que você está vendo, mesmo! Vou falar mais uma vez de Pé de Cabra, Asa de Sapo, de Rafael Soares de Oliveira. A razão é simples: há mais de um mês, sem exageros, leio todos os dias o livro para o Antônio. A escolha, apesar da qualidade do livro, não é minha. É dele. Não há dia em que o Antônio não peça para ler as quadrinhas sobre seres mitológicos e para apreciar as ilustrações. A repetição é tanta que ele já sabe de cor as 38 quadrinhas. A sua preferida é sobre o Dobarchu, um ser da mitologia irlandesa, meio lontra e meio cachorro, que o encantou não apenas pelos versos de sua quadrinha, mas por ser conterrâneo do David, um amigão do Pedro que mora em Dublin. O fato de ele, todas as noites e algumas vezes durante o dia, declamar as quadrinhas do livro, no entanto, não estraga a graça da leitura. Muito pelo contrário! Graças à sua memória de criança, está podendo brincar de ler sozinho. Brincar, isso mesmo, já que ainda não sabe ler! A graça tem sido, todos os dias, antes da minha leitura que ganhou ares dramáticos com a colaboração teatral do Pedro, o Antônio pegar o livro e "ler" sozinho em voz alta. Uma graça! Depois, me pede para ler. Mas sua ansiedade é tamanha, que, se adianta, e "lê" sozinho algumas das quadrinhas. Mesmo sabendo que tudo não passa de uma gostosa brincadeira de faz de conta, fico orgulhosa do meu menino "lendo" sua história favorita. Por essas e por outras, que ficam por conta do talento do escritor e do ilustrador Jean Galvão, só tenho a agradecer a existência de Pé de Cabra, Asa de Sapo. Lamento apenas as falhas da distribuição do livro, que fazem com que o interessado em tê-lo ou comprá-lo para presentear um amigo, como o Antônio já sugeriu, tenha que esperar 10 dias para recebê-lo em compras pelos sites das principais livrarias do Rio. Alô, Ática! Faz isso com a gente, não! Enche as livrarias de Pé de cobra, asa de sapo para divertirmos nossas crianças, com os seres de Rafael e Galvão.
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
A porta aberta pela literatura

sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Gente boa do Brasil e da América Latina
Vale a pena colocar na agenda o colóquio que o Programa de Alfabetização e Leitura (Proale), da Faculdade de Educação da UFF, está promovendo em Niterói. No dia 4 e 5 de outubro, escritores e ilustradores brasileiros e latino americanos vão conversar sobre literatura para crianças e jovens leitores. Uma bela oportunidade de ouvir gente que faz boa literatura. Para quem se interessar, o Proale oferece também um curso de extensão para professores, Mais informações no site do programa.
sábado, 22 de setembro de 2012
Um tangolomando para falar da macacada
Os macacos sempre foram os meus bichos preferidos. Macaco pequeno, médio ou grande sempre me faz rir e sonhar com uma vida mais livre, em que eu possa pular de galho em galho, comendo para não morrer e me divertindo com o meu bando. Uma de minhas lembranças de criança envolve um mico danado, amarrado em uma coleira e vivendo em um poleiro de bar de estrada, que avançou nos meus cabelos em vez de pegar a batata frita que eu lhe oferecia. O susto foi grande, chorei como toda criança faria, mas guardei esta aventura em uma das gavetinhas de bons momentos do arquivo de minha memória. Essa afeição pelos primatas faz com que eu olhe com simpatia para todas as histórias que falam de macacos. Macacos contra jacarés, onças e jabutis garantem diversão e aulas de malandragem para toda a família. Imagina eles em um bando de dez, como quis a escritora Anna Flora em Cada macaco no seu galho? A história, que ganhou delicadas e bem humoradas ilustrações de Cláudio Martins e foi editada pela Formato, fica ainda mais divertida por ser um tangolomango. Eu também adoro tangolomangos, aquela brincadeira cantada que começa com 10 pessoas, bichos ou objetos e que, após tirar um a um, acaba com nenhum. Há muitas versões populares de tangolomangos, que outrora garantiram divertidas brincadeiras de criança, e autorais, que hoje dão belos livros ilustrados. São tantas que perco a conta. Aqui no GATO DE SOFÁ comentei pelo menos duas destas versões: a da Tatiana Belink, Os 10 sacizinhos, e da Graça Lima, Os 10 patinhos. Mas é sempre legal descobrir mais uma versão bacana, ainda mais quando se tem em casa um menino pré-escolar que se diverte contando dedos, batatas fritas e outras cositas até chegar ao infinito. E Cada macaco no seu galho, além de nos permitir os prazeres da matemática, traz ao fim da história um glossário com diversas espécies de primatas e um livro de brincadeiras para curtir ainda mais as divertidas ilustrações de Cláudio Martins e fazer a festa da criançada que gosta de uma tesoura. Na verdade, nem precisava. A história já garante festa boa, festa de macacada!
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
Humor e fantasia na dose certa

terça-feira, 11 de setembro de 2012
O Antônio e sua paixão pelos cachorros
É certo que
cada leitor tem lá suas idiossincrasias. Eu, confesso, tenho várias. Mas para
mim é um mistério como elas surgem e se consolidam. O Antônio, meu caçula de
cinco anos, desde muito pequeno escolhe suas leituras. Seus critérios nem
sempre são estéticos ou temáticos. Um deles, muito claro, é geográfico. Ele
rejeita todos os livros vindos da estante maior de seu quarto, que ele
convencionou ser a do Pedro. "Mãe, você não sabe que eu não gosto de nada
desta prateleira?", me inquire com convicção. Ele só aceita livros da
estante mais baixa do quarto, instalada na época em que ele, bebê, não
alcançava a mais alta. Nunca imaginei, com isso, estar estabelecendo limites
para sua curiosidade. Minha estratégia tem sido, sem que ele veja, mudar os
livros de andar para que ele os aceite. Mas nem sempre isso funciona. O Antônio
parece adulto em vitrine de livraria. Ele implica com a capa, com o tipo de
letra da impressão, com o formato do livro, enfim, com critérios de seleção totalmente aleatórios. Desta severa triagem sobram alguns
preciosos livros que
ele recorre de tempos em tempos. Há poucos dias, ele recuperou na primeira
prateleira de sua estante a coleção do Bolinha, de Eric Hill, editada pela
Martins Fontes. Os livros ilustrados contam as travessuras de um cachorrinho, com a ajuda de abas que escondem seus amigos, objetos ou seus pais. Nesta
segunda temporada de Bolinha, um de seus prediletos quando ainda era pequetito, Antônio se divertiu muito. Se divertiu ouvindo as histórias,
abrindo as abas e "lendo" sozinho cada linha guardada na memória. Depois do Bolinha,
ressuscitou o Otto. Lindo cachorrinho, criado pelo californiano Tod Parr e editado pela Panda Books. Otto foi nossa leitura insistente por muito tempo,
o que fez o Antônio batizar com seu nome um cachorro de pano que herdou do irmão. Suas memórias caninas podem ter a ver com seu desejo de ter um cão, ultimamente alimentada, em seu imaginário, pela existência da Nikita, a cachorra da mulher de seu padrinho,
prometida a ele em uma brincadeira levada muito a sério. Diante disso tudo, não tive dúvidas quando vi nas livrarias Rita e Treco na praia, de Jean-Philippe Arrou-Vignod, editada pela Rocco Jovens Leitores. Comprei-o, certa de que tinha as qualidades necessárias para agradar o Antônio: falava de cachorros e contava uma história. Quando mostrei o livro, ele foi peremptório. "Não quero ouvir essa história. Não gosto dessa história." Foi, então, que decidi ignorá-lo e lê-la alto, sem dar bola a suas intervenções. Lá pela quinta página, ele já estava disfarçando e ouvindo as aventuras da menina Rita e de seu cachorro Treco. Não passou muito tempo para que pegasse o livro para apreciar as ilustrações de Olivier Tallec, que dão vida a Rita e Treco, em traços de cartum que lembram clássicos franceses, como Sempé. Fiquei feliz de ter acertado e, assim, conseguir ampliar a coleção de livros do meu caçula.
quinta-feira, 23 de agosto de 2012
Descobrindo a serventia da língua
Confesso que já tinha visto algumas vezes nas prateleiras da Paulinas o livro Girafa não serve para nada, de José Carlos Aragão, ilustrado por Graça Lima, e nunca me decidira por ele. Até que outro dia resolvi trazê-lo para casa. Que bom! Minha demora em lê-lo me preparou para apreciá-lo melhor. Aragão, um escritor mineiro que já me encantara em Trem chegou, trem já vai, faz um relato poético de como um menino - que suponho ser ele, o autor - tomou contato com a língua e foi desamarrando a camisa de força imposta por ela. Sua poesia, com certeza, vem desse embate com a língua, que lhe permitiu um novo e pessoal uso das palavras. Brincando de descobrir a serventia das coisas, Aragão experimenta novos significados para palavras prosaicas, como pedra, chuva, trem, relógio e ovo. Significados poéticos, como o dado para relógio - "caixa de guardar tempo perdido, casa para passarinho que perdeu o voo" - que vão ampliando seu olhar para o mundo e o libertando da tirania da língua, em sua busca do mais amplo uso das coisas. "Com o tempo, as respostas que me davam. além de incompletas, foram ficando vazias de importância. Descobrir por conta própria o uso de cada coisa foi ficando muito mais interessante que ganhar uma resposta já prontinha e embrulhada para presente", escreve Aragão, em Girafa não serve para nada. Ao ler o livro lembrei-me de minha estranheza, quando criança, diante das imposições da língua, que me fazia perguntar a meus pais o porque de cada coisa ter um determinado nome. Estranheza igual a de Marcelo, Marmelo, Martelo, clássico de Ruth Rocha, que encontra em Girafa não serve para nada nova e original tradução. Livros como este mostram como o prazer com a leitura deve ser construído à margem do processo de aquisição da língua, que, na maioria das vezes, é muito penoso para as crianças, como foi para mim. Ler não deve ter a ver com aprender português. A leitura literária tem a ver com a descoberta de que é possível encontrar na língua um universo maior do que nos propõem os gramáticos, capaz de nos fazer encarar o desafio de traduzir nossos sentimentos e impressões, apesar das limitações da palavra escrita. Aragão fez a sua parte. Que nós - pais, escola e Estado - sejamos capazes de fazer a nossa, para que nossos filhos percebam que o uso criativo da língua constrói um mundo de sutilezas e de liberdade e que, ao o atravessarmos, nos tornamos mais humanos.
sábado, 28 de julho de 2012
João e Maria em terceira dimensão

segunda-feira, 23 de julho de 2012
Chiclete, uma boa razão para seguir lendo
Tenho passado pouco pelo blog. Sei disso. A vida está corrida, muitas coisas ao mesmo tempo, mudanças por vir. Mas nossa rotina leitora continua. O Antônio não dorme sem ouvir uma história. É seu momento mágico de aconchego, em que reclama seus direitos de filho e disputa meu amor com o irmão. Ele sempre me quer a seu lado, lendo para ele e depois o aguardando pegar no sono. Os dias que leio primeiro para ele para depois ler e fazer um cafuné no Pedro são um inferno em sua vida. Ele chora, pergunta mil vezes se eu não vou dormir em sua cama, tenta estragar a leitura do irmão, leva broncas, não raro é expulso do quarto, enfim, um tumulto. Mas o amor de irmão, quando verdadeiro, supera todos estes momentos. Tanto que outro dia, exausta, deitei cedo, avisando que não leria para ninguém. Os dois, maior e menor, entraram em meu quarto de mãozinhas dadas para tentar mais uma vez. Diante de minha negativa saíram e se ajeitaram como puderam. Foi quando eu vi, encantada, o Pedro lendo para o irmão. Os dois juntinhos, na mesma cama, lado a lado, como dois irmãos amados. Naquela hora, quem visse, não poderia imaginar as inúmeras brigas, as implicâncias, as chatices, os egoísmos, enfim tudo o que anima e desespera a vida de quem tem irmão. O Pedro, muitas vezes, se condói do Antônio e cede para ele. Já o contrário, é pouco comum. O Antônio, nos últimos tempos, tem apelado para garantir minha presença em sua cama ao lembrar dos momentos em que o irmão, irado comigo, diz que sou chata. "Mãe, o Pedro nem gosta de você!" Não posso deixar de lembrá-lo que ele também me renega em seus chiliques e que, apesar de raivas passageiras, os dois continuam a me amar, assim como eu não deixo de amá-los nos momentos em que quase me levam a loucura. Assim, nessa animação de casa com muitas crianças, vamos recebendo novos personagens em nossa vida. O último a chegar foi Chiclete, o irmão mais novo de Judy Moody. O personagem apareceu primeiro na série dedicada à sua irmã, um sucesso da Editora Salamandra no público formado por meninas pré-adolescentes, e acabou ganhando vida própria pelas mãos de Megan McDonald, com a ajuda das ilustrações de Peter H. Reynolds. Não é a leitura sonhada pelas mães, mas é leitura que agrada a nossos filhos, com uma narrativa que mistura humor e escatologia. Confesso que acho o universo de Chiclete pobre, mais pobre ainda do que muitos de seus concorrentes, como As Aventuras do Capitão Cueca e o Diário de um Banana, mas ele agradou ao Pedro e é isso que me importa, neste momento, para não deixar que se afaste dos livros à medida que a adolescência se aproxima. Pedro já leu três dos cinco livros do irmão de Judy Moody e só deixou o quarto de lado para ler o sexto da série do Banana, recém-lançado no Brasil. Assim, segue lendo. Bobagem ou não, é o livro que o encanta neste momento da vida. Que ele possa encontrar, sempre, em toda a sua vida, personagens que lhes deem razões para continuar a ler.
domingo, 8 de julho de 2012
Estela e Marcos e as delícias da infância
Para retomar meus escritos por aqui, nada melhor do que uma série de livros de Marie Louise Gay, editada pela Brinque-Book, que me encanta há anos. Ela conta a história dos irmãos Estela e Marcos, duas crianças encantadoras. Tão encantadoras que aqui em casa encantaram a mãe, o pai, o Pedro e o Antônio. Cada um a seu tempo. O Pedro foi o primeiro a sucumbir ao charme dos irmãos, quando nos chegou às mãos Bom Dia, Marcos, pela ciranda de livros de sua escola. Foi amor à primeira vista. O menino, com ares de bebê e seu cachorro Fred sendo ajudado pela irmãzinha maior a acordar e a se vestir nos conquistou e, com certeza, fez meu filho mais velho antever sua relação com o Antônio, então um menino recém-nascido. A paixão de Pedro pelos dois irmãos era tanta, que fomos aos poucos comprando os oito livros da série. Nesse tempo o Antônio cresceu e passou a ser mais um leitor de Marie-Louise. Foi ele quem me pediu, recentemente, para comprar Estela, rainha da neve. Comprei e vi o Antônio tomar o lugar do Pedro na hora de ler as aventuras dos dois irmãos. Marie-Louise tem uma qualidade rara nos autores para crianças. Ela fala sem qualquer constrangimento, como uma criança. Suas histórias não são sobre elas, nem para elas. São simplesmente delas. Marcos é bem pequenino e pergunta absurdos para a irmã, que, apesar de um pouco mais crescida, ainda pensa com a lógica do maravilhoso e dá respostas tão absurdas quanto as perguntas. Ao absurdo dos diálogos somam-se as delicadas ilustrações da autora, que, assim, cria um clima de fantasia que encanta até mesmo os adultos. O Pedro ria-se todo das bobagens de Marcos e o Antônio, mais crédulo e fantasioso, pergunta o tempo todo se as respostas de Estela estão corretas. Ele fica muito curioso para saber a idade dos irmãos e arrisca um palpite: Estela tem cinco anos e o Marcos, dois. No embalo, sonha o impossível que é ter mais um irmãozinho, desta vez, mais novo. Os dois, cada um a sua maneira, divertem-se a valer com as histórias de Marie-Louise que foram traduzidas para 15 idiomas e já venderam mais de um milhão de cópias. Este sucesso levou os dois irmãos para o Canal Disney do Canadá, que exibe semanalmente uma série de desenhos animados inspirados em Estela e Marcos, que por lá são Stella e Sam. Aqui em casa, os dois meninos vivem apenas nos livros de Marie-Louise e na nossa imaginação. Agora ainda mais. Sábado passado, durante a festa junina da escola dos meninos, tivemos a felicidade de completar nossa coleção. Quando vi, lá estava Bom Dia, Marcos no balcão de prendas, esperando ser escolhido por alguma criança. Sugeri ao Antônio pegar o livro e ele topou. Assim, completamos a série pelo primeiro livro que lemos. E o encontramos no mesmo lugar que o vimos pela primeira vez - na escola. De noite, depois da festa, foi hora da leitura. O Pedro, do alto de seus 10 anos protestou, dizendo que era livro de criancinha e, portanto, chato. Mas, a verdade, apareceu logo nas primeiras frases da narrativa. Pedro parou para ouvir a história e o Antônio amou. Mais uma noite feliz ao lado de Estela e Marcos.
terça-feira, 12 de junho de 2012
Namoro também é assunto de criança


sábado, 9 de junho de 2012
Irmãos de verdade, no amor e no ódio
Livros para crianças são como livros para adultos. A cada dia que os abrimos, nos surpreendemos com uma nova leitura. É esse o grande barato de quem gosta de guardar seus livros. Poder revisitá-los e ter uma nova emoção, revivendo o que para muitos é um amontoado de papel velho. Assim, tem sido na minha vida e na dos meus meninos. A gente implica com um livro e depois faz as pazes com ele. A gente gosta de algum e um tempo depois, vê que gosta ainda mais. Não foi diferente com Por favor, Eleonor!, de Frieda Wishinsky, editado pela Brique-Book. Eu o comprei para o Pedro, logo depois que o Antônio nasceu, animada com as delicadas ilustrações da canadense Marie-Louise Gay - sou fã dela - e li algumas vezes para ele, que, como eu e o irmão, ama as histórias de Estela e Marcos. O livro foi mais um para o Pedro. Não causou nenhuma emoção maior e acabou rapidamente esquecido na estante. Até que há poucos dias o resgatei das prateleiras para lê-lo para o Antônio. Apresentei João e Eleonor como primos da Estela e do Marcos, parentesco garantido no traço de Marie-Louise Gay e na verdade da relação dos dois irmãos. Esses dados garantiram empatia imediata entre Antônio-leitor-ouvinte e os personagens. O resto ficou por conta da identificação com a história de João e Eleonor. O irmão mais velho passa grande parte da história desejando que a menina, sua imã, caia fora. Como a menina não cai fora, ele passa a desejar que ela seja um cachorro. É quando um estranho cão aparece na história e deixa João desesperado, com medo de seu desejo ter se transformado em realidade. Tenho certeza de que o Antônio sabe bem o que é isso. Sabe também o que é desejar estar perto do irmão mais velho e não ser desejado. Sabe também o que fazer para levar o outro à loucura. Sabe ainda o que é esquecer-se desse desejo quando um amigo aparece. Essa verdade, contida no livro, vale mais do que mil histórias de irmãos fraternos e amorosos para apaziguar os ódios passageiros que só acometem irmãos que se amam. O Pedro, no seu tempo de curtir o livro, ainda não tinha esta experiência com o Antônio, que não passava de um bebê. Agora, com os dois grandes, brigando como João e Eleonor, a história ganhou novo sentido, antes oculto no texto e nas ilustrações. Ganhou o Antônio, que pode ver que ele e o Pedro não são os únicos irmãos a amarem-se no amor e no ódio.
sexta-feira, 25 de maio de 2012
Olha a cara do meu Gato de Sofá!

quarta-feira, 16 de maio de 2012
Para não esquecer jamais!
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terça-feira, 15 de maio de 2012
Assim é se lhe parece!
A verdadeira história dos três porquinhos, da dupla de autor e ilustrador Jon Scieszka e Lane Smith, chegou aqui em casa pelas mãos do Antônio, que, sendo o primeiro na chamada, teve o privilégio de abrir a escolha dos livros da ciranda. Tem lobo, porquinhos... é esse mesmo! Escolheu sem qualquer sombra de dúvidas e chegou em casa todo orgulhoso, com o livro editado pela Companhia das Letrinhas. Eu já o conhecia, mas confesso implicava com ele, como com quase todos que tornam-se campeões de venda. Mas neste caso, se ele virou um best-seller, virou por seus méritos e não deméritos. A verdadeira história dos três porquinhos, lançado em 1989, é o primeiro livro da dupla de autor e ilustrador e, com certeza, um dos primeiros a desconstruir um conto de fadas. Mas Scieszka, um renomado autor para crianças, faz isso com o maior talento, o que livra a narrativa de ser mais uma história politicamente correta ou desmistificadora dos contos tradicionais, tão em voga nos últimos anos. Pelo contrário, o livro reforça o caráter maravilhoso das histórias tradicionais ao criar dúvidas sobre o papel do lobo na morte dos porquinhos, da casa de palha e de madeira, e na tentativa de invasão da casa de tijolos. O formato depoimento, proposto pelo autor, é a grande sacada. que dá uma dimensão maior à história contada pelo lobo mau. Ele pode estar falando a verdade ou não. Suas críticas aos meios de comunicação, que, segundo ele, o endemonizaram, podem ser justas ou apenas uma estratégia de sua defesa para livrá-lo da culpa. Pois é, guardando as devidas proporções. a história me lembrou livros reportagens produzidos por jornalistas americanos, com entrevistas de condenados por crimes de grande repercussão. Ao fecharmos o livro de Scieszka, fica a dúvida se o lobo é mais um psicopata ardiloso ou uma vítima de coincidências infelizes, exploradas com sensacionalismo pela mídia. Tudo isso com a sutileza que uma narrativa desta natureza exige, para que a história não resvale no didatismo. Bom ou mau, mais uma vez uma bela história de lobo!
quarta-feira, 9 de maio de 2012
Minha homenagem a Maurice Sendak
Acabo de ler no jornal que o escritor e ilustrador americano Maurice Sendak morreu ontem, aos 83 anos, em decorrência de um derrame sofrido há dias. Fiquei triste, mesmo sem nunca tê-lo visto. Conheço de Sendak apenas o livro Onde vivem os monstros, editado aqui no Brasil pela Cosac Naify. Sei que não basta, mas para mim foi o suficiente para entender sua importância na cena da literatura infantil. Max, o menino protagonista do livro ilustrado, ganha no traço e texto de Sendak uma profundidade psicológica, digna de grandes personagens. Sua viagem à terra dos monstros, onde torna-se rei, dá ao pequeno leitor inúmeras possibilidades. Ele é a própria criança em diálogo com seus medos, desejos, fantasias e ansiedades. Sua mãe, a antagonista da história, está presente apenas no pensamento do menino, que desobedece, transgride, inventa e desafia, mas, como um bom filho, à casa torna. Max, podemos dizer sem medo, é a criança sadia. A criança que experimenta, sem, no entanto, cortar os laços com o mundo real. Ele vai e volta da terra dos monstros, com a certeza de que haverá um prato de comida quentinho o esperando. Para nós, convidados por Sendak para esta aventura, fica a certeza de que uma boa história é sempre uma rica viagem. Assim, que o Antônio a entende todas as vezes que a leio para ele. Já ouviu inúmeras vezes as aventuras de Max, na terra dos monstros, mas está sempre disposto a mais uma vez. Ele, mais que o Pedro, que conheceu a história com quase oito anos, assim que ela foi lançada no Brasil, curte as possibilidades da narrativa de Senadk. Curte tanto que, todas as vezes que a ouve, resolve assumir a identidade de um dos monstros - sempre o mesmo, que representam a subjetividade da criança em todas as suas possibilidades, do humor ao terror. Um belo livro, que, com certeza, justifica uma vida. Fica aqui minha homenagem a este grande autor, que ganhou os dois mais importantes prêmios mundiais da literatura infantil - o Hans Christian Anderson, em 1970, e o Astrid Lindgren, em 2003.
Quem quiser, ler outro comentário do Gato de Sofá sobre o livro, clique aqui.
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domingo, 6 de maio de 2012
Uma história que passa de geração em geração
Fiquei tão feliz quando, por acaso, achei na estante de uma livraria O grande rabanete, de Tatiana Belinky, editado pela Moderna, que resolvi ler a história ali mesmo para o Antônio. Tão logo iniciei a leitura, vi que Tatiana Belinky mais uma vez o conquistara. Ele foi, com a maior animação e atenção, até o fim da história do agricultor que tenta, sem sucesso, puxar um rabanete da terra. A razão de tanto interesse encontra-se no talento de Tatiana em contar ou recontar uma história, como é o caso de O grande rabanete, uma releitura do conto tradicional russo O nabo gigante, recolhido no século XIX pelo grande Leon Tolstoi. Tatiana, russa radicada no Brasil, conta no fim do livro que, como não gosta de nabo, escolheu o rabanete para recontar a história que ouvia na infância de seu avô. O resultado de seu talento, aliado a uma bem-humorada ilustração de Claudius, produz um belo livro para crianças. A animação do Antônio foi tanta que resolvi comprar o livro, que, diga-se de passagem, estava na minha lista de desejos há anos, desde que o conheci por meio de uma ciranda de livros da escola. Lemos na livraria de manhã e relemos à noite em casa, quando tive a grata surpresa de vê-lo decorar o texto para fingir que estava lendo sozinho. Fiquei encantada com o Antônio narrando, com a maior segurança, o esforço do agricultor em retirar o grande rabanete da terra e os reforços que conquistou no meio do caminho para, ao fim, rir-se todo do ratinho garboso, que resolve ficar com os louros do esforço de todos. Tatiana tem razão, esta é uma história para lembrar-se por toda a vida e passar de geração em geração. Não a toa, em 12 anos, o livro já ganhou duas edições e 34 reimpressões. Que Tatiana nos conte outra!
domingo, 29 de abril de 2012
A gente se encontra na Flist
O fim de semana promete em Santa Teresa, com a realização da quarta edição da FList (Festa Literária de Santa Teresa). O bairro, que vê o Rio de cima, vai receber, dias 5 e 6 de maio, escritores, ilustradores, contadores de histórias, músicos e atores para louvar a magia da literatura. Literatura para crianças e jovens. Literatura para todos, como faz o homenageado da vez, Joel Rufino dos Santos. Ele, que crê no poder transformador da palavra, vai estar na festa para receber homenagens de seus pares e afagos de seus leitores. Não será só Joel que vai receber loas. 2012 é um ano de muitas lembranças. Darcy Ribeiro faria 90 anos, Nelson Rodrigues e Luiz Gonzaga, 100. Datas a serem comemoradas pela Flist, que programou debates e homenagens a estes grandes de nossa cultura. No mais, é a alegria de sempre, que terá fecho de ouro com o show do Cordão do Boitatá. Dá uma olhada na programação. A gente se encontra no Parque das Ruínas.
sexta-feira, 20 de abril de 2012
O leão que, como o Antônio, não sabia escrever
Há tempos eu paquerava A história do leão que não sabia escrever, de Martin Baltscheit, editado pela Martins Fontes, mas acabava fazendo outra escolha. Sabe como é, via outro livro que tinha mais a ver com o momento de meus filhos, ou mesmo o meu, e deixava ele de lado. Até que, outro dia fui à livraria trocar uns livros que o Antônio havia ganho repetido, e, quase uma hora depois de estar revirando tudo em busca de um que me encantasse, me deparei com o leão. Me deu aquele estalo de que o momento era aquele. Assim como o leão, o Antônio não sabe escrever e está encantado com uma menina da turma. Ela não é uma leoa, como a namorada do protagonista da história, mas nasceu sob o signo deste felino imponente e está fazendo o meu filhote ficar todo prosa. Mais prosa, ainda, ele está com as possibilidades que a intimidade com as letras e os números pode lhe dar. Os dedinhos, como já falei aqui, não param de trabalhar para construir a leitura ou o raciocínio matemático. Uma graça! E A história do leão que não sabia escrever só veio colaborar com este momento do Antônio. Ele amou o livro, com divertidas ilustrações do autor, acompanhou as tentativas do leão - bicho por bicho - de encontrar um escriba que falasse de seus sentimentos pela leoa, até que, cansado de tanto insucesso, bradou para toda a floresta o que se passava em seu coração. Como dizem as crianças, ele fez do seu jeito e deu certo. Conquistou a namorada e começou a aprender a escrever. O Antônio aprovou e vibrou quando ele escreveu o a. A de Antônio!
terça-feira, 10 de abril de 2012
Tecendo histórias, noite após noite
Em nova fase, dormindo cedo para acordar mais cedo ainda, o Pedro sempre chega à hora de deitar-se caindo de sono, o que o faz muitas vezes rejeitar as histórias que ofereço. Cada vez que diz não à minha intenção de ler para ele, lembro do enorme tempo que dedica à TV e à internet e penso que minha luta para trazê-lo para um mundo de leitores ainda não acabou. Chegamos, nós dois, a conversar sobre isso, sobre as possibilidades da leitura para vencer o tédio que toma conta das crianças às vésperas da adolescência e de como alguns personagens mexem com nosso imaginário e, assim, desvendam um mundo interior até, então, envolto em névoas. Ele ouviu atento, disse que gosta de histórias, mas que só gosta de ler, com suas próprias pernas, alguns poucos livros. Pensei que talvez esteja na hora de levá-lo a uma livraria para que escolha suas leituras. Mas enquanto este momento não vem, decidi prender a atenção de meu menino com As mil e uma noites, a coletânea de contos árabes iniciada pela fantástica história de Sherazade para livrar seu povo da fúria do Rei Shariar, que depois de traído resolve dormir cada dia com uma virgem e entregá-la, ao amanhecer, à morte. Sherazada buscou no fascínio dos contos um estratagema para manter-se viva e, noite após noite, poupar uma moça de seu povo. O rei, encantado com as histórias, a mantém viva por mil e uma noites, até que desiste de sua vingança para viver a seu lado. As histórias são realmente fascinantes pelo mundo exótico que apresentam e pela violência vivida com naturalidade, sem os floreios dos contos tradicionais europeus que ganharam, nos últimos séculos do segundo milênio, cores mais suaves do as originais. Li sem medo as histórias apresentadas por Sherazade ao despótico Rei Shariar para o Pedro, que espantou-se mais com as diferenças culturais da vida dos personagens do que com a violência por eles vivida. Interrompeu a leitura de Ali Babá e os 40 ladrões para entender como um homem casado promete casar-se com sua cunhada, que acaba de enviuvar de seu irmão. A violência, naturalizada por um contexto fantástico, não o chocou, como não choca a nós adultos. Ao fim de duas noites, Pedro, assim como Shariar, estava totalmente ganho para o universo fantástico prometido por uma boa história. Só não sei por quantas noites.
Em tempo: a edição que estou lendo para o Pedro é a da Cosac Naify, destinada a jovens leitores. As mais belas histórias das mil e uma noites, reunidas pela holandesa Arnica Esterl, ganham belíssimas ilustrações da russa Olga Dugina. As ilustrações de príncipes, princesas, ladrões e animais contribuem ainda mais para que o leitor embarque no universo oriental dos contos e faz do livro uma preciosidade para adultos e crianças. Mas como a edição só traz cinco contos, decidi comprar a tradução de Ferreira Gullar para As mil e uma noites, da Editora Revan. O livro, que ainda está sendo aguardado aqui em casa, não tem o mesmo apelo gráfico da edição da Cosac Naify, mas, em compensação, tem o texto de Gullar sobre a primeira coletânea publicada no Ocidente, em 1704, pelo francês Antoine Galland. São 18 histórias selecionadas e traduzidas por Gullar, que vão garantir mais algumas noites de boas histórias aqui em casa.
Em tempo: a edição que estou lendo para o Pedro é a da Cosac Naify, destinada a jovens leitores. As mais belas histórias das mil e uma noites, reunidas pela holandesa Arnica Esterl, ganham belíssimas ilustrações da russa Olga Dugina. As ilustrações de príncipes, princesas, ladrões e animais contribuem ainda mais para que o leitor embarque no universo oriental dos contos e faz do livro uma preciosidade para adultos e crianças. Mas como a edição só traz cinco contos, decidi comprar a tradução de Ferreira Gullar para As mil e uma noites, da Editora Revan. O livro, que ainda está sendo aguardado aqui em casa, não tem o mesmo apelo gráfico da edição da Cosac Naify, mas, em compensação, tem o texto de Gullar sobre a primeira coletânea publicada no Ocidente, em 1704, pelo francês Antoine Galland. São 18 histórias selecionadas e traduzidas por Gullar, que vão garantir mais algumas noites de boas histórias aqui em casa.
sexta-feira, 30 de março de 2012
Uma nova chance para a história do Brasil
O Pedro está estudando na escola a colonização brasileira e, em decorrência disso, as violências cometidas pelo português contra os índios nativos e os negros africanos. Seu primeiro espanto com este mundo, perdido no passado, foi saber que havia mais de cinco milhões de indígenas em terras brasileiras, quando o português-branco-colonizador por aqui chegou, e que hoje, o resultado do extermínio desses povos é termos apenas 300 mil índios entre os brasileiros. Ele ficou chocado também com a violência da escravidão negra, que trouxe para nossas terras cerca de quatro milhões de negros da África para sofrer, aqui, como escravos. A luta desses povos pela liberdade o impressionou. Índios guerreando contra portugueses e morrendo de tristeza e em decorrência de doenças dos brancos e negros cometendo o suicídio, matando seus senhores, queimando lavouras e fugindo. A história do Quilombo de Palmares e seu líder guerreiro, Zumbi, prendeu sua atenção e o fez entender um pouco a luta do dominado diante da força do dominador. O fez entender também a razão de a Constituição brasileira reconhecer que a terra é um direito ancestral dos indígenas e que, portanto, o Governo deve garanti-la em forma de reservas. Entendeu também o porquê deste direito ter sido estendido aos remanescentes dos quilombos, como forma de reparação ao sofrimento imposto aos antepassados dos atuais quilombolas. Por fim, espantou-se que, em pleno século XXI, índios e negros ainda possam ser tungados pelos brancos, ao saber que uma maioria conservadora admitiu, quarta-feira, na Comissão de Constituição de Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, proposta de emenda constitucional que tira do Executivo a prerrogativa de criar reservas indígenas e ambientais e reconhecer o direito dos quilombolas à terra. A PEC 215/2000 determina que o Congresso Nacional avalize os atos do Executivo de demarcação de terras para fins de reservas indígenas ou ambientais ou de reconhecimento de quilombos. Isso quer dizer, na prática, que a PEC 125, apoiada com fervor pela bancada ruralista, maioria no Congresso, retira de índios e negros direitos garantidos depois de muito sofrimento e luta. Estes senhores de terras, sempre ávidos por aumentar suas fronteiras agrícolas, estão negando a nós, brancos, negros, indígenas e mestiços brasileiros, a esperança de avançarmos, cada vez mais, para um país em que natureza e diversidade cultural sejam um bem de todos. Esta é a lição que Leonardo Boff nos dá no belíssimo livro O casamento entre o céu e a terra, editado pela Salamandra, que nos serve com um pequeno painel da riqueza da cultura indígena no Brasil e do desrespeito com que foi tratada pelo branco-português-colonizador. Sobre os negros, temos A história dos escravos, de Isabel Lustosa, pela Companhia das Letrinhas, para apresentar a nossos filhos. No mais, só espero que nós, brasileiros do século XXI, possamos enfim mudar esta história de expropriação e exploração! O primeiro passo é pressionarmos o Congresso Nacional a derrotar em plenário esta maldita PEC 215 e, assim, darmos uma nova chance à história do Brasil.
quarta-feira, 28 de março de 2012
O alfabeto, segundo Millôr Fernandes
Em homenagem a Millôr Fernandes e a Antônio, com sua fome de letras, posto aqui duas maravilhas da obra deste grande jornalista, escritor, cartunista e humorista, que acaba de nos deixar.
Alfabeto Concreto
ABCdário
Esta composição gestaltiana levou anos, literalmente, para ser feita. Foi melhorando na medida em que o tempo - os anos, Deus meu! - foram passando. Publicada a primeira vez em 1958, na revista O Cruzeiro, foi reescrita para várias publicações. Não se consegue fazer esse tipo de coisa, numa sentada só. Tem que ser um pouco chinês.
O A é uma letra com sótão. Chove sempre um pouco sobre o à craseado. O B é um l que se apaixonou pelo3. O b minúsculo é uma letra grávida. Ao C só lhe resta uma saída. O Ç cedilha, esse jamais tira a gravata. OD é um berimbau bíblico. O e minúsculo é uma letra esteatopigia (esteatopigia, ensino aos mais atrasadinhos, é uma pessoa que tem certa parte do corpo, que fica atrás e embaixo, muito feia). O E ri-se eternamente das outras letras. O F, com seu chapéu desabado sobre os olhos, é um gangster à espera de oportunidade. O f minúsculo é um poste antigo. A pontinha do G é que lhe dá esse ar desdenhoso. O gminúsculo é uma serpente de faquir. O H é uma letra duplex. A parte de cima é muda. Serve também como escada para as outras letras galgarem sentido. O h minúsculo é um dinossauro. O I maiúsculo guarda, em seu porte de letra, um pouco do número I romano. O i minúsculo é um bilboquê. O J, com seu gancho de pirata, rouba às vezes o lugar do g. O j minúsculo é uma foca brincando com sua bolinha. Vê-se nitidamente; o K é uma letra inacabada. Por enquanto só tem os andaimes. Parece que vão fazer um R. Junto com o k minúsculo o K maiúsculo treina passo-de-ganso. O L maiúsculo parece um l que extraíram com raiz e tudo. Mas o lminúsculo não consegue disfarçar que é um número (1) romano espionando o número arábico. O M maiúsculo é um gráfico de uma firma instável. O m minúsculo é uma cadeia de montanhas. O N é um M perneta. No nminúsculo pode-se jogar críquete com a bolinha do o. O O maiúsculo boceja largamente diante da chatice das outras letras. O o minúsculo é um buraquinho no alfabeto. O p é um d plantando bananeira. Ou o q, vindo de volta. O Q maiúsculo anda sempre com o laço do sapato solto. O q minúsculo é um p se olhando de costas ao espelho. O R ficou assim de tanto praticar halterofilismo. Sente-se que o s é um cifrão fracassado. O Smaiúsculo é um cisne orgulhoso. Na balança do T se faz jusTiça. O U é a ferradura do alfabeto, protegendo o galope das idéias. O u minúsculo é um n com as patinhas pro ar. O V é uma ponta de lança. O W são vês siameses. O X é uma encruzilhada. O Y é a taça onde bebem as outras letras. Desapareceu do alfabeto porque se entregou covardemente, de braços pra cima. O Z é o caminho mais curto entre dois bares. O zminúsculo é um s cubista.
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